21 de novembro

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Especialistas alertam: nova Lei Urbanística de Niterói pode “expulsar” moradores atuais da Região Oceânica

Por Sônia Apolinário
| aseguirniteroi@gmail.com

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Valorização pode deflagrar processo de gentrificação, afastando moradores mais pobres; projeto será discutido no  Conselho Municipal de Políticas Urbanas (Compur)
projeto parque orla piratininga
Prefeitura apresentou ilustração que mostra como vai ficar um trecho de Piratininga após a conclusão do Parque Orla. Foto: Prefeitura de Niterói

Foram quase seis meses de debates, críticas, intervenções do Ministério Público, mas, agora, a Secretaria municipal de Urbanismo e Mobilidade finalmente convocou para a próxima segunda-feira, dia 21, uma reunião do  Conselho Municipal de Políticas Urbanas (Compur) para “deliberação acerca do Anteprojeto de Lei Urbanística de Niterói”. Toda a preparação, no entanto, não encerra as polêmicas sobre o projeto:  especialistas identificaram no texto o risco das mudanças propostas provocarem um processo de gentrificação na Regiâo Oceânica, principalmente, na área de Piratininga.

Gentrificação é um processo de transformação urbana que “expulsa” moradores de bairros periféricos e transforma essas regiões em áreas nobres. A especulação imobiliária, o aumento do turismo e obras governamentais são responsáveis por esse fenômeno.

“Não se justifica”

Junto com a convocação para a reunião foram enviadas as “devolutivas” da secretaria às sugestões para a Lei de Urbanismo feitas durante uma “oficina” convocada pela Prefeitura há quatro meses para debater o assunto.

Das 30 observações, a maior parte recebeu um breve comentário: “não se justifica.” Catorze foram aceitas. Naquele evento, o secretário municipal de Urbanismo e Mobilidade, Renato Barandier, afirmou que o Governo pretendia enviar o texto do Anteprojeto de Lei para a Câmara dos Vereadores antes do final do ano legislativo.

Leia mais: ‘Qual é o problema de cumprir a lei?’ Vereadores e Ministério Público questionam projeto de aumento de gabarito em Niterói

Entre as sugestões descartadas está a proposta de revisão do gabarito proposto de 15 pavimentos, em Charitas,  que dobra o tamanho das construções no bairro, segundo a Prefeitura uma das “áreas estratégicas para o direcionamento do crescimento urbano”. Também não foi acatada a diminuição de 30 metros quadrados para 22 metros quadrados do tamanho mínimo de unidades habitacionais.

Uma sugestão aceita, mas com ressalvas, foi a inclusão do “prédio da Caixa” (prédio na Av. Amaral Peixoto desocupado desde 2019) como ZEIS, Zona Especial de Interesse Social, que são porções do território destinadas, predominantemente, à moradia digna para a população da baixa renda.

“O instrumento mais adequado para a definição de um imóvel coletivo já construído como ZEIS é a edição de um decreto específico, uma vez que o mapa de zoneamento da cidade busca identificar áreas com certo grau de heterogeneidade”, disse a secretaria de Urbanismo.

Região Oceânica

Trocando em miúdos o “urbanês”, especialistas ouvidos pelo A Seguir avaliaram que o novo anteprojeto de Lei difere pouco do PL n° 416/21 que a Prefeitura retirou da Câmara Municipal, em junho, após ações do Ministério Público do Rio de Janeiro. E não altera a proposta de aumento de gabarito na Região Oceânica.

O vereador Paulo Eduardo Gomes, cujo mandato dispõe de especialistas que acompanham as discussões da reforma urbanística da cidade, alertou para a existência de uma “explícita proposta de gentrificação” da população que habita entre a Av. Sete e a Lagoa de Piratininga.

Já Gonzalo Pérez Cuevas, do Conselho Comunitário da Região Oceânica de Niterói (CCRON), identificou um “objetivo de adensamento” da RO sem, porém, haver “contrapartidas” em termos de mobilidade e infraestrutura.

As duas observações convergem num ponto, a permissão de construção de imóveis de 10 pavimentos ao longo da Av. Sete, a partir da saída – entrada do túnel Raul Veiga. Ao que se soma o aumento em dois andares do gabarito na orla de Piratininga e a permissão de gabarito de seis andares entre a Lagoa e a rua Florestan Fernandes, em Camboinhas.

Mais engarrafamentos

– A questão não diz respeito somente a ter mais pessoas na Região Oceânica, mas a ter também mais carros transitando na região. A infraestrutura atual não comporta novos edifícios, sem contar a questão do trânsito – comentou Gonzalo.

Ele observou que o “pêndulo” do movimento na RO se divide em: um grande contingente de pessoas chega, via transportes públicos, para trabalhar na região, enquanto os moradores do local saem de carro para os seus trabalhos fora dali.

Mobilidade é questão básica na RO. A TransOceânica não funciona adequadamente, as vias expressas ficam ociosas na maior parte do tempo. Cadê o catamarã social em Charitas? – questiona Gonzalo.

A preocupação com o aumento dos carros deve-se ao fato de que a percepção dos especialistas é que, nas áreas citadas, o Anteprojeto de Lei estaria “focado” em atrair um público diferente dos que atualmente moram no local. Isso porque, “edificação de dez pavimentos não é algo que seja perfil de construção de cunho social”, como observou o vereador Paulo Eduardo Gomes.

Ele ainda afirmou que, em relação às possíveis novas construções ao longo da Av. Sete, não haverá obrigatoriedade de pagamento de Outorga Onerosa do Direito de Construir, que é um valor que se paga à Prefeitura para se construir até o limite máximo permitido de uma região.

– A Proposta do Executivo de permitir construções de até 10 pavimentos impossibilita a manutenção da população no local por dificuldade  de arcar com futuros ônus condominiais. Além disso, propõe não considerar a cobrança de outorga onerosa do direito de construir reiterando o favorecimento ao mercado imobiliário. Percebo uma explícita proposta de gentrificação da população que, há anos, habita a Comunidade da Ciclovia, entre a Av. Sete e a Lagoa de Piratininga – afirmou o vereador.

Na sua opinião, o texto do Anteprojeto de Lei “acintosamente privilegia o mercado imobiliário em detrimento de parte dos 37% da população em Assentamentos Precários e Irregulares”.

Sobre isso, voltando às devolutivas, uma das propostas não aceitas foi a de contemplar na nova lei as cerca de 200 zonas ZEIS previstas no plano de regularização fundiária.

O que diz a secretaria

“A quase totalidade das áreas mencionadas é de pequenas propriedades,  31 imóveis que não se configuram como uma zona abrangendo áreas com certo grau de heterogeneidade. Nesse contexto, o artigo 18 da Lei Federal nº 13.465/2017 prevê que a Reurb não está condicionada à existência de ZEIS, autorizando o procedimento de regularização fundiária de núcleos urbanos informais independentemente de estarem inseridos ou não dentro de ZEIS”.

Essa decisão, na interpretação dos especialistas, não dá segurança para as comunidades até que a regularização fundiária aconteça. Nesse meio tempo, em caso de maior interesse do mercado imobiliário pela região, haverá assédio para a venda dos imóveis, gerando o processo de gentrifiação, mencionado pelo vereador.

A se lembrar que a área da Av. Sete, do lado da Lagoa de Piratininga, já está sendo urbanizada. Também já foram licitadas, pela Prefeitura, obras de urbanização em comunidades, tais como drenagem, asfalto e saneamento, vizinhas ao Parque Orla de Piratininga.

– Vamos aguardar que o Anteprojeto siga todo o trâmite exigido pelo abaixo assinado da população e o Ministério Público e seja submetido ao Conselho de Meio Ambiente e à Comissão de Patrimônio do Conselho de Culturas – afirmou Paulo Eduardo Gomes.

Reurb

Sobre Reurb, a Prefeitura de Niterói informou, no seu site, que durante o mês de novembro vai realizar um workshop sobre Regularização Fundiária. A atividade é uma parceria da Secretaria Municipal de Habitação e Regularização Fundiária (SMHRF) com a Escola de Governo e Gestão (EGG), da Secretaria de Planejamento, Orçamento e Modernização da Gestão (SEPLAG), e é destinada a servidores municipais e convidados.

De acordo com o secretário municipal de Habitação e Regularização Fundiária, Roberto Fernandes Jales, o Beto da Pipa, objetivo do workshop “é nivelar os conhecimentos, otimizar procedimentos e criar sinergia entre os diversos órgãos da administração de forma a diminuir o tempo de concessão do tão sonhado título de propriedade”.

 

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