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O pastor Felippe Valadão, da Igreja Lagoinha, foi indiciado na terça-feira (16), pelo crime de intolerância religiosa, pela Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi).
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O caso aconteceu em maio de 2022, num evento oficial da prefeitura de Itaboraí. Na época, o município comemorava 189 anos com shows de artistas gospel. Num intervalo, Valadão subiu ao palco e discursou:
– De ontem para hoje tinha quatro despachos aqui na frente do palco. Avisa aí para esses endemoniados de Itaboraí: o tempo da bagunça espiritual acabou, meu filho. A igreja está na rua. A igreja está de pé. Pode matar galinha, pode fazer farofa, pode fazer o que você quiser. E ainda digo mais: prepara para ver muito centro de Umbanda sendo fechado na cidade. Eu declaro ver um templo aí. Deus vai começar a salvar esses pais de santo que tem aí na cidade. Você vai ver coisa que você nunca viu na vida. Chegou o tempo, Itaboraí. Aquele espírito maligno de roubalheira na política acabou.
Um vídeo com o discurso do pastor foi anexado ao inquérito. Em relatório encaminhado ao Ministério Público do Rio de Janeiro, a delegada Rita de Cássia Salim Tavares afirmou que ficou clara a prática de intolerância religiosa, “no sentido de que se pretendeu impor um único padrão religioso sem o respeito à diversidade e liberdade religiosa”.
Durante as investigações, Valadão prestou depoimento na Decradi. Segundo ele, no dia do evento, sua fala teve cerca de meia hora de duração e o vídeo exibe “menos de um minuto” desse tempo.
Ele afirmou, também, ter proferido “palavras em defesa da própria fé, acreditando que pessoas de outras religiões poderiam se converter à fé cristã” e que nessas palavras tinha o objetivo de “evangelizar” os presentes.
Sobre sua fala de que “muitos centros de Umbanda da seriam fechados”, no município, disse ter sido editada. Segundo o pastor, os locais seriam fechados porque umbandistas seriam convertidos e os centros “não teriam razão para existir”. Ainda em seu depoimento, o pastor afirmou que “jamais” incitou a violência contra centros ou pessoas de religiões de matrizes africanas.
A Igreja Batista Lagoinha nasceu em 1957 na periferia de Belo Horizonte (MG) e passou a ser liderada por Márcio Valadão 15 anos depois. Ele é pai de Ana Paula, André e Mariana – Felippe Valadão é cunhado de André.
Os três herdeiros, ainda jovens, passaram a liderar ministérios e cultos, além de investirem na carreira artística e pastoral, fortalecendo o poder da família dentro e fora da instituição. A Lagoinha conta, atualmente, com mais de 700 filiais pelo Brasil e o mundo.
Em 2022, aos 74 anos, o pastor Márcio deixou a liderança da igreja, em Belo Horizonte, após 50 anos à frente da instituição.
Desde os primórdios, o ministério da família Valadão é pautado pela Teologia do Domínio, criada para ampliar o impacto cristão na agenda social dos Estados Unidos e importada para o Brasil por meio de missionários e pregadores. Segundo a teoria, os cristãos devem dominar sete esferas da sociedade: religião, família, educação, política, mídia, artes e entretenimento e negócios.
Durante o governo de Jair Bolsonaro, Lagoinha e família Valadão tiveram grande ligação com a então ministra e atual senadora Damares Alves, que é membro da igreja. Também receberam na sede, em Belo Horizonte, os então presidente e primeira-dama Michelle.
O domínio pela arte se dá, principalmente, por meio da banda Diante do Trono, uma das mais importantes referências musicais do cenário gospel brasileiro. Com estética verde e amarela e bandeiras do Brasil, o grupo já chegou a reunir 1 milhão de pessoas na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.
A Igreja Lagoinha também é dona da emissora de televisão Rede Super e da Rádio Super, que veicula cultos da Lagoinha e programação cristã em 13 estados brasileiros.
A família Valadão costuma proferir falas homotransfóbicas. Em uma das pregações, com título “Deus odeia o orgulho”, André inferiu que é responsabilidade dos cristãos provocar a morte de pessoas LGBTI+. Acabou denunciado ao Ministério Público de Minas Gerais pela deputada federal Erika Hilton.
A Lagoinha também tem em sua estrutura a Estância Paraíso, um retiro espiritual na região metropolitana de Belo Horizonte, já denunciado como um local que possui um tratamento de “reversão de sexualidade”, conhecido popularmente como cura gay.
Fonte: G1 e The Intercept Brasil
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