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Sai “Ê Alafiou, ê Alafiá”. Entra “Sobô Nirê Mafá”.
Se em 2024, a Unidos do Viradouro ecoou o chamado de reverência ao ‘ninho da serpente’ e se sagrou campeã do Carnaval do Rio, agora, a agremiação vai evocar no Sambódromo a falange de Malungos, tema do enredo de 2025.
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Na busca do bicampeonato, a escola de samba de Niterói vai acender “tudo o que for de acender” e deixar a fumaça entrar, para proteger sua passagem pela Marquês de Sapucaí. Porém, não é somente com amparo espiritual que a escola pretende conquistar o público e os jurados, na avenida. No plano terreno, o amparo está na força da própria comunidade.
Este ano, todas as quintas-feiras, a diretoria da Viradouro promoveu reuniões setoriais na quadra. Em cada uma delas, o carnavalesco Tarcísio Zanon mostrava as fantasias que os componentes iriam usar com as devidas explicações sobre o que representavam no enredo e, consequentemente, no desfile.
– É um momento muito energizante. Parece até que estamos no meio da apuração porque, quando as alas veem as fantasias, os componentes ficam emocionados, felizes. E conhecem o que vão representar no desfile. Entendendo que cada componente é um artista para essa grande festa, eles saem daqui entendendo o que são, de verdade, no desfile – contou Zanon.
Essa experiência começou a ser feita ainda de forma um pouco tímida, no ano passado. E segundo o carnavalesco, “o retorno foi muito grande”.
Para além da valorização de cada componente, essa iniciativa tem um “efeito colateral”: facilita a própria montagem da escola.
– A gente explica como monta cada item da fantasia. Por isso, a gente tem certeza que a Viradouro, mais uma vez, vai fazer um grande espetáculo porque nossa comunidade sabe, literalmente, vestir a fantasia – disse Zanon.
É bom que se explique que, na Viradouro, todas as fantasias são dadas pela escola aos seus componentes. Na verdade, são emprestadas porque, após o desfile, tem uma convocação para devolução do traje.
A cada ano, no máximo, duas alas são liberadas para venda de fantasias para “forasteiros”. No caso da escola, ser da comunidade não significa, necessariamente, ser morador do morro do Viradouro. Será considerado da comunidade da escola quem se compromete com o desfile e participa, religiosamente, dos ensaios – às terças-feiras, na quadra; aos domingos, na Amaral Peixoto (Centro de Niterói) e, depois, nos dias de ensaios técnicos no Sambódromo. A lista de presença tem olhos severos.
“Malunguinho – O Mensageiro de Três Mundos” é o tema do enredo do Carnaval 2025 da Unidos do Viradouro. Trata-se de uma entidade afro-indígena, que se manifesta como Caboclo, Mestre e Exu/Trunqueiro.
Sua história remete ao estado de Pernambuco, na primeira metade do século 19. O quilombo do Catucá era foco de resistência e viu seu último líder, João Batista, o Malunguinho, ser duramente perseguido por seus atos libertários.
Ao fugir das emboscadas, ocultou-se na mata e aprendeu com os indígenas o segredo da força das ervas. Assim, tornou-se Mensageiro de Três Mundos: Mata, Jurema (planta sagrada) e Encruzilhada.
Malunguinho é o dono da chave mágica para abrir senzala e fechar o corpo dos que a ele rogam proteção. O que ronda a mata para vencer inimigo, trazendo a ciência dos pajés, os caminhos da cura.
“Sobô Nirê Mafá!” é como o Reis Malunguinho é saudado.
Como explicou Zanon, a Viradouro vai contar a história do Reis Malunguinho em duas esferas: a histórica e a espiritual, “onde ele é caboclo, mestre e Exu (mensageiro e intermediário entre os seres humanos e as divindades)”.
– A gente pretende alcançar o coração da Marquês de Sapucaí – disse o carnavalesco que admite que, na escola, a expectativa está bem alta, para a realização do desfile.
Isso não significa, porém, “salto alto” ou vozes das próprias cabeças da escola gritando “é campeã”.
– O barracão está de vento em popa, todos estão ensaiando muito na nossa quadra. Com certeza, a felicidade já está embalando as fantasias e alegorias, feitas com muito carinho, muita dedicação para exaltar esse grande herói nacional que é o Reis Malunguinho.
A gente está muito feliz – afirmou Zanon.
Revelar detalhes sobre fantasias, alegorias e adereços a dias do desfile, é claro que o carnavalesco não faz. O único spoiler que ele se permite é um aviso: prestem atenção no Carro 5, o do Exu Trunqueiro:
– É um carro bastante orgânico, com uma cenografia bem interessante, com materiais flexíveis que são para encapar fio e dão uma ideia de arame farpado. Quem chega perto, pensa que vai se espetar. É um carro todo detalhado, trabalhado como se fosse uma cenografia, mesmo. A gente está apostando muito no efeito desse carro.
O desfile das escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro terá uma grande novidade, em 2025: ao invés de dois, serão três dias de apresentações, com quatro agremiações por vez.
A Viradouro será a terceira a desfilar no primeiro dia, no domingo, 2 de março. A primeira a entrar no Sambódromo será a Unidos de Padre Miguel. O encerramento, na terça-feira, 4 de março, caberá à Portela.
Ordem dos desfiles
Domingo (2 de março)
Segunda-feira (3 de março)
Terça-feira (4 de março)
O samba da Viradouro apresenta várias possibilidades de “brincadeiras” da bateria comandada por Mestre Ciça com ritmos do candomblé. A letra talvez não seja tão fácil de aprender, “de cara”, no Sambódromo. Porém, o refrão é candidato a se tornar “chiclete” na avenida:
A chave do cativeiro/Virado no Exu Trunqueiro/Viradouro é Catimbó!/Viradouro é Catimbó!
Eu tenho corpo fechado/Fechado, tenho meu corpo/Porque nunca ando só/(Porque nunca ando só!)
Confira a letra do samba-enredo da Viradouro cujos compositores são: Paulo César Feital, Inácio Rios, Marcio André Filho, Vaguinho, Chanel, Igor Federal e Vitor Lajas.
“Acenda tudo que for de acender
Deixa a fumaça entrar
Sobô Nirê Mafá, Sobô Nirê!
Evoco, desperto nação coroada
Não temo o inimigo
Galopo na estrada
A noite é abrigo
Transbordo a revolta dos mais oprimidos
Eu sou caboclo da mata do Catucá!
Eu sou pavor contra a tirania!
Das matas, o Encantado
Cachimbo já foi facão amolado
Salve a raiz do Juremá!
Ê, juremeiro! Curandeiro, ó!
Vinho da erva sagrada
Eu viro num gole só
Catiço sustenta o zeloso guardião
Trago a força da Jurema
Não mexe comigo, não!
Entre a vida e a morte, encantarias
Nas veredas da encruza, proteção
O estandarte da sorte é quem me guia
Alumia minha procissão
Do parlamento das tramas
Para os quilombos modernos
A quem do mal se proclama
Levo do céu pro inferno
Toca o alujá ligeiro, tem coco de gira pra ser invocado
Kaô, consagrado!
Reis Malunguinho, encarnado, pernambucano mensageiro bravio
O rei da mata que mata quem mata o Brasil! (bis)
A chave do cativeiro
Virado no Exu Trunqueiro
Viradouro é Catimbó!
Viradouro é Catimbó!
Eu tenho corpo fechado
Fechado, tenho meu corpo
Porque nunca ando só
(Porque nunca ando só!)”
Ouça o samba-enredo da Unidos do Viradouro, aqui
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