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Uma mulher chamada Esperança

Por Sônia Apolinário
| aseguirniteroi@gmail.com

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Marilene Esperança é a fundadora da Associação Brasileira de Acesso a Cannabis Medicinal do Rio de Janeiro cuja sede fica em Niterói
cannabis abre
Marilene tem permissão individual para plantar e fazer medicamento para o filho. Foto: reprodução rede social

Aos 19 anos, Marilene da Silva Lima de Oliveira era uma estudante do Supletivo, no Rio do Ouro, bairro de Niterói onde nasceu e foi criada, quando teve seu primeiro filho, Lucas.

Quando ele fez 4 anos, já separada, ela estava procurando trabalho quando percebeu algo estranho no filho. Naquele momento, Marilene não poderia imaginar os dias, anos que se seguiriam.

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Em resumo, ela veio a descobrir que Lucas sofria de uma doença rara, a Síndrome de Rasmunssen, que causa epilepsia com crises convulsivas constantes.

– Lucas chegava a ter 40 convulsões por dia. Depois de uma crise muito violenta, ele perdeu os movimentos e ficou em estado vegetativo. Ele tinha 9 anos – conta Marilene.

Marilene e Lucas. Foto: Divulgação.

Avançando no tempo, encontramos, agora, Lucas com os movimentos totalmente recuperados. Aos 21 anos, mas com idade mental de 14, frequenta escola e é um jovem com relativa autonomia.

Quanto à Marilene, que adotou o sobrenome Esperança, comanda uma instituição que emprega 23 pessoas e, dentre suas atribuições, algumas são bem peculiares: plantar, colher e manipular Cannabis.

Ela é a fundadora e presidente da Associação Brasileira de Acesso a Cannabis Medicinal do Rio de Janeiro cuja sede fica no Centro de Niterói. A AbraRio conseguiu, na Justiça, o direito de produzir remédio derivado da planta para disponibilizá-lo unicamente a seus associados previamente cadastrados e apenas mediante aprovação médica.

Atualmente, a AbraRio tem 1.500 associados que lidam, em sua maioria, com casos de autismo em crianças de 6 a 9 anos.

Na sexta-feira (10), por iniciativa da Associação, será realizada, das 10h às 17h, a 1ª Conferência de Saúde Canábica de Niterói, no auditório da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Centro da cidade. O evento é aberto para a população e contará com vários especialistas, tanto na área de Medicina quanto do Direito.

– Ao final do evento, vamos produzir uma carta a ser entregue na Conferência Municipal de Saúde que está prestes a ser realizada. Queremos incluir a medicação à base de cannabis nas discussões relacionadas com a política pública de saúde. A demanda por esse tipo de medicamento é muito grande – informa Marilene.

Segundo ela, um projeto de lei que permitiria a distribuição gratuita do medicamento na rede municipal de saúde de Niterói chegou até a ser aprovado, em 2021, pela Câmara Municipal. Porém, esse é um tipo de iniciativa que, por  lei, precisa partir do Executivo e não do Judiciário e o PL foi engavetado.

Foi depois de muita peregrinação em consultórios médicos que Marilene teve a prescrição de uso de cannabis para Lucas. No Brasil, trata-se de um medicamento importado e caro. Foi graças à ONG Abrace Esperança, da Paraíba, que a medicação chegou gratuitamente às mãos de Marilene. Lucas ingeriu as primeiras gotas quando tinha 14 anos.

Foi aos primeiros sinais de melhora do filho que Marilene adotou seu novo sobrenome.

Estimulada pela Abrace, ela criou, há dois anos, a AbraRio e, desde então, trava, também, uma luta jurídica. Desde julho de 2021, Marilene tem permissão individual para plantar e fazer o óleo para o filho. Liminares a garantem fornecer o medicamento para os associados da instituição – no momento, inclusive, a última foi cassada e ela entrou com recurso.

Os óleos produzidos pela AbraRio. Foto: Divulgação.

Sua produção mensal é de 500 a 600 frascos de óleo de 30 ml, extraídos de cerca de duas mil plantas. Envolve o trabalho de uma equipe formada por engenheiro agrônomo, engenheiro químico e farmacêutico.

Cada frasco custa entre R$ 150 e R$ 220, contra R$ 5 mil, o importado. Dependendo da prescrição, cada pode durar até três meses. No caso de Lucas, dura dois meses e esse é, atualmente, o único remédio que ele toma. Marilene informa que 25% dos associados da AbraRio recebem os frascos gratuitamente.

Segundo ela, no Brasil, existem 150 associações que amparam usuários de medicamentos à base de cannabis, mas somente 7 têm produção para produzi-los.

Sim, no início ela teve medo de arriscar esse tipo de tratamento. Sim, até hoje, fazem “brincadeiras” relacionadas com a sua “produção”.

– Hoje levo as brincadeiras na esportiva. De uma maneira geral, as pessoas reconhecem a dimensão do que estamos fazendo. A cannabis terapêutica salva vidas e não vou medir esforços para levar este tratamento para cada vez mais pessoas. Eu que sei tudo o que passei para me aborrecer, agora, com piadas. Atualmente, meu filho faz até malcriação e eu acho tudo muito bom – conta ela que se casou pela segunda vez e teve mais três filhos.

Confira os participantes da Conferência que será realizada na Avenida Ernani do Amaral Peixoto – 507 – 10º andar

Ladislau Porto – advogado

Ana Célia D’avila – Coordenadora da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) Emílio Figueiredo – Advogado

Leandro Portugal – Vereador

Monique Prado – Assessora parlamentar na área de Política de drogas na ALERJ

Rebeca Sophia – Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Justiça e Segurança (PPGJS) pela Universidade Federal Fluminense (UFF)

Solange da Cunha – Presidente da comissão de direito médico e da saúde da OAB Niterói

Pamela Carvalho – pesquisadora-ativista das relações raciais e dos direitos das populações de favela

Angélica Souza dos Santos – Acolhedora da AbraRio

Marilene e sua “fazenda”. Foto: reprodução rede social.

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