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Por que a Niterói Rotativo quer usar o “carro da multa”? O que o morador ganha e o que perde?

Por Redação
| aseguirniteroi@gmail.com

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Contrato da Niterói Rotativo começou em 1999 e vai até 2039; empresa administra 5.100 vagas, a R$ 5, por período de duas horas
Estacionamento Niterói
Projeto prevê possibilidade de aaumento do número de vagas, apesar dos riscos de congestionamentos Fotos: arquivo

A notícia de que a Niterói Rotativo testava um carro com múltiplas câmeras para a fiscalização e cobrança das 5.100 vagas de estacionamento de rua existentes na cidade deixou uma pergunta no ar para os moradores: por que usar o carro da multa?

A resposta talvez demore a aparecer, com a decisão da Prefeitura de Niterói de proibir o uso do veículo. Mas o objetivo da medida aparece no projeto de lei encaminhado para a Câmara Municipal: reduzir os custos da operação e a perda de receita com a dificuldade de cobrança, que a empresa calcula em 42% do potencial de arrecadação, embora não revele quanto arrecada com o serviço.

A intenção é estimular o uso do aplicativo do Niterói Rotativo, para que a cobrança seja feita sem necessidade da presença do cobrador. Hoje, este uso representa 55% da arrecadação, mas a equipe de 150 guardadores não dá conta de cobrir todas as vagas. E muitos carros estacionam sem fazer o pagamento, daí o cálculo da evasão de receita.

O sistema é adotado em cidades como São Paulo, onde o pagamento é todo feito por aplicativo e a fiscalização se dá pelo carro da multa, que circula pelas ruas da cidade e fotografa os veículos estacionados: se o estacionamento não estiver pago, o carro é multado.

A vantagem para a empresa é que amplia a cobrança com menos funcionários e menor despesa. Para o morador, cria o desconforto de ter que lidar com o celular e o aplicativo, no meio da rua, numa cidade com população de idosos e alta ocorrência de roubos de celulares.

Além disso, em muitos pontos da cidade, a presença dos guardadores é uma proteção para o morador, contra a ação agressiva dos flanelinhas. Em São Francisco, muitos moradores chegaram a pedir a ampliação do rotativo à noite para afastar os flanelinhas.

A decisão da Prefeitura de proibir o uso do “carro da multa” não muda os termos do projeto de lei a ser votado na Câmara, que abre caminho para a adoção do modelo “automático” de cobrança. A mensagem define, por exemplo, que a empresa não pode ser responsabilizada por roubos e danos aos veículos estacionados. O entendimento é que a empresa a paga um pedágio pelo uso da vaga, não um valor pelo estacionamento. Com a segurança de que não terá esta responsabilidade, não é necessário o guardador.

O preço do estacionamento em Niterói é um dos mais caros do país, R$  5, por período de duas horas, contra R$ 2, por quatro horas no Rio. A Niterói rotativo alega que a comparação é indevida, porque no Rio o sistema é informal, e aqui a empresa tem todos os guardadores regularizados e investe na construção de estacionamentos e, como os de Charitas e do Centro. Segundo a concessionária, já foram investidos mais de R$ 30 milhões, desde o início do contrato em 1999.

Em muitos centros urbanos, o valor do estacionamento é alto para forçar a diminuição do uso do carro. Mas não é o caso de Niterói, que tem expandido seguidamente a oferta de vagas em áreas densamente ocupadas, como Icaraí.

A proposta não define a criação imediata de novas vagas, mas deixa aberta a possibilidade, a critério da concessionária e do órgão regulador, apesar dos congestionamentos recorrentes na cidade.

40 anos de contrato

Pelos próximos 15 anos, a Niterói Rotativo seguirá como a empresa privada responsável por explorar as vagas de estacionamento da cidade. O contrato com a Prefeitura, iniciado em 1999, completou 25 anos em 2024 e segundo informou a concessionária, só termina em 2039.

Neste momento do percurso de uma parceria que vai totalizar 40 anos, a preocupação da prefeitura é com a modernização do sistema de estacionamento rotativo da cidade. Por conta disso, mandou para a Câmara dos Vereadores, no dia 10 de maio passado, uma Mensagem Executiva, já tornada Projeto de Lei (Nº 98/2024), que começa a dar os primeiros passos na Casa Legislativa.

Sob análise das comissões, já recebeu parecer favorável da Comissão Permanente de Constituição e Justiça. O presidente-relator da CCJ, Rodrigo Farah, resumiu da seguinte forma a iniciativa do governo:

“Autoriza a Concessionária Niterói Rotativo, supervisionada pela Secretaria de Conservação e Serviços Públicos, a modernizar o sistema de cobrança, fiscalização, gestão e administração do Estacionamento Rotativo, garantindo a integridade financeira e auditoria imediata das receitas. A cobrança será realizada por meio de equipamentos emissores de tíquetes, totens, aplicativos ou outros meios virtuais.

A fiscalização será feita através da identificação e registro da placa dos veículos, permitindo o controle da arrecadação e da rotatividade das vagas. A gestão das receitas será em tempo real e pronta para auditoria permanente, e os usuários deverão adquirir o tíquete ou ativar o crédito ao ocupar a vaga”.

A preocupação com esse controle financeiro seria uma evasão de receita que a concessionária informou ser da ordem de 42% proveniente de estacionamento irregular – ou não foi pago ou não foi pago na totalidade do tempo utilizado na vaga. Porém nem a Niterói Rotativo nem a prefeitura informam o valor da receita do estacionamento na cidade.

“O modelo de fiscalização de estacionamento rotativo em Niterói tem como objetivo coibir o uso irregular de vagas de estacionamento rotativo, visando ao aprimoramento da eficiência, a redução da evasão de receita e a criação de um ambiente de estacionamento mais dinâmico e racional”, diz um trecho do PL, na sua justificativa.

“Carro da multa”

Carro com multicâmeras da Niterói Rotativo que circulou por Icaraí, esta semana. Foto: Leitor

A Seguir questionou a Niterói rotativo sobre a possibilidade de vir a ser instituído o  “carro da multa”na cidade. Recebeu a seguinte resposta, por intermédio de nota:

“ A modernização do sistema seja através de câmeras, leitores de OCR ou aplicativo tem como premissa a fiscalização do sistema rotativo. O princípio do Rotativo é promover a rotatividade das vagas existentes, racionalizar o uso do solo em áreas adensadas, disciplinar o espaço urbano bem como permitir uma maior oferta de vagas de estacionamento aos munícipes.

Esta semana, porém, um carro equipado com múltiplas câmeras foi flagrado circulando por Icaraí. A Niterói Rotativo negou que era um “carro da multa” em teste.

Sobre o veículo, afirmou ser um “carro de monitoramento, que atualmente está fazendo testes de ajustes no  georreferenciamento de vagas para publicação das mesmas no SISGEO”, o que significa uma “otimização da operação por parte da Concessionária”.

Em São Paulo

O “carro da multa” circula por São Paulo desde 2021. Foto: reprodução. Em São Paulo, o “carro da multa” é realidade desde 2021. São operados pela Estapar, empresa que gerencia os estacionamentos, no município desde dezembro de 2020.

São 80 veículos com câmeras circulando pelas ruas. Os modelos utilizados pela empresa para a fiscalização são: Hyundai HB20, Fiat Uno, Fiat Mobi e Renault Kwid.

As câmeras instaladas no teto dos carros utilizam sistema de Reconhecimento Óptico de Caracteres (OCR). Os dados obtidos pela leitura são enviados para uma central de informações em tempo real, que confere se as placas estão associadas ao sistema da Zona Azul (estacionamento autorizado nas vias), além de analisar o tempo de uso disponível para o veículo.

Dessa forma, o fiscal é informado de qualquer irregularidade presente nas vagas. Além de confirmar se as informações obtidas pelas câmeras são verdadeiras. Caso o fiscal confirme a irregularidade, os dados são enviados para a CET-SP, e a multa devida será aplicada.

Para o A Seguir, a Niterói Rotativo informou também que não possui poder de emitir multas, embora o PL estabeleça a parceria entre a empresa e os órgão fiscalizadores.

Autor de várias das 12 emendas já apresentadas ao PL Nº 98/2024, o vereador Daniel Marques “esbarrou” com o carro multicâmera na rua Gavião Peixoto.

– Quando ele parou, bati no vidro do motorista e perguntei  se era um carro do Niterói Rotativo. O motorista respondeu que sim, que era do ‘novo contrato’ – contou Marques.

Ele acredita que o veículo pode ser, sim, o “carro da multa” já sendo operacionalmente testado (mas não emitindo multas) por conta de uma confiança de que o PL será aprovado “porque o governo tem maioria na Câmara”.

Pelo sim, pelo não, no dia seguinte após matéria do A Seguir que mostrou o carro, a Prefeitura de Niterói emitiu comunicado informando que não autorizou a Niterói Rotativo a usar carros com câmeras para a fiscalização de estacionamento irregular.

Disse a prefeitura, por intermédio de nota:

“A Prefeitura de Niterói informa que não autorizou a concessionária Niterói Rotativo a fazer qualquer tipo de fiscalização com carros. A prefeitura já notificou a empresa para esclarecer sobre o suposto carro que estaria circulando na cidade, reiterou expressamente a não autorização para esse tipo de procedimento, nem para testes ou para implementação futura. A Prefeitura esclarece que o não cumprimento das determinações pela concessionária Niterói Rotativo poderá acarretar em multas e até mesmo o rompimento do contrato de maneira unilateral pelo poder concedente.”.

Número de vagas

Parar na rua ficou 25% mais caro este ano.

Atualmente, 5.100 vagas estão disponíveis pelas ruas de Niterói.  Apesar de não determinar sobre aumento desse número, o PL não descarta a possibilidade. Para isso, orienta que a secretaria de Conservação e Serviços Públicos será responsável por determinar as vias e logradouros públicos, bem como os dias e horários de funcionamento do sistema de estacionamento rotativo.

A escolha dos locais, segundo o texto,  “será baseada em critérios técnicos de necessidade e viabilidade, como fluxo viário, destinação da via e proximidade a polos geradores, com o objetivo de expandir a oferta de vagas de estacionamento em vias e logradouros públicos”.

Para os moradores de vias escolhidas para vagas do estacionamento rotativo, o PL garante gratuidade para um veículo, mediante cadastramento – uma regra que já é válida.

Atualmente, a Niterói Rotativo tem 160 colaboradores nas ruas trabalhando na cobrança pelo estacionamento. Segundo a concessionária, não há previsão de redução de quadro.

O PL também condiciona um aumento do atual número de vagas a uma revisão da “contrapartida contratual destinada ao Município”.

O contrato entre a Prefeitura de Niterói e a Niterói Rotativo previa, como contrapartida da concessionária, a criação de três estacionamentos. Segundo o vereador Daniel Marques, a empresa conseguiu negociar termos e sua obrigação passou a ser a criação de dois estacionamentos, que foram feitos. São eles, o de Charitas e outro em frente ao Plaza Shopping.

A Prefeitura fica com 2,5% do dinheiro arrecadado. Ou seja, de cada R$ 5 que o usuário, o Município fica apenas com R$ 0,12 – doze centavos -, e a concessionária com R$ 4,88.

Tarifas

O valor de R$ 5, a serem pagos a cada duas horas, se aplica às vagas de ruas. O Niterói Rotativo, porém, administra outros estacionamentos. No Terminal Rodoviário João Gourlart; no Valonguinho (ambos no Centro) e na garagem em Charitas, carros pagam R$ 7 por uma hora ou fração.

Em dias de eventos com cobrança de ingressos no Caminho Niemeyer, porém, o esquema do estacionamento no terminal rodoviário muda. A tarifa é única, podendo chegar a R$ 25.

– Cobrar por estacionamento irregular é correto. A questão são os termos do contrato entre a empresa e a prefeitura. Muita coisa vem sendo questionada, inclusive pelo Ministério Público, há tempos. O projeto de lei, inclusive, contempla alguns ajustamentos de condutas determinados pelo MP – informou o vereador que é da opinião que o contrato é mais vantajoso para a empresa do que para o município.

O estacionamento rotativo sofreu aumento de 25% este ano, em pleno carnaval, quando passou de R$ 4 para R$ 5 por duas horas de estacionamento. Na época, a prefeitura justificou a decisão pelo atraso na tarifa, apesar da comparação desigual com os valores cobrados no Rio: R$ 2, por quatro horas.

Na avaliação da concessionária, a comparação dos preços praticados no Rio “não pode ser estabelecida com as principais cidades do Brasil, inclusive Niterói, visto que todos os funcionários da concessionária possuem vínculo formal de emprego, com carteira assinada pelo piso estadual mais comissionamento, benefícios e contribuição previdenciária”.

Segundo a empresa, tal prática não ocorre no Rio, “hoje abarcado pela informalidade e falta de transparência”.

Em nota, listou ainda seus encargos, conforme o modelo de operação que atua, no caso, Concessão Onerosa: “além da outorga contratual de 2,5%, ISS 5%, PIS 0,65%, COFINS 3,0%, existe a obrigação de construção de garagens subterrâneas com recursos próprios – investimentos já realizados que montam a importância de cerca de R$ 30 milhões – e que ao término da Concessão, serão entregues ao Município”.

O PL em análise na Câmara dos Vereadores prevê um período máximo de estacionamento de duas horas, podendo ser prorrogado, apenas uma vez, por mais duas, mediante novo pagamento.

“O tempo de estacionamento inicia-se a partir do momento em que o veículo ocupa a vaga, devidamente verificado eletronicamente pela concessionária, através das plataformas de fiscalização autorizadas”, estabelece o projeto de lei que acrescenta:

“O serviço de estacionamento rotativo não acarretará para o Município de Niterói a obrigação de guarda e vigilância dos veículos, não respondendo por acidentes, danos, furtos, ou quaisquer outros prejuízos de qualquer natureza, que os veículos ou usuários venham a sofrer nos locais regulamentados como estacionamento rotativo”.

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