2 de dezembro

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O Candongueiro resiste como endereço do samba em Niterói

Por Sônia Apolinário
| aseguirniteroi@gmail.com

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Depois de um período fechado, a tradicional casa de samba da cidade retoma, aos poucos, suas atividades, agora também como centro cultural
Foto de Sônia Apolinário
A roda de samba do Candongueiro é Patrimônio Cultural Imaterial de Niterói. Foto: Sônia Apolinário
Houve uma época em que o endereço Estrada Velha de Maricá, nº 1554, em Pendotiba, era apenas onde morava uma família. O casal se mudou para lá com seu filho de cinco anos atraído pelo ar pacato de roça da região.

Tempos depois, o endereço “cresceu”. Não era apenas um local, mas sinônimo de Samba e frequentar a roda do Candogueiro era onde os amantes de cultura popular, do Rio de Janeiro e de Niterói, queriam estar – mas nem sempre conseguiam entrar, por conta da lotação esgotada. Por um tempo, porém, tudo parou.

No próximo sábado (13), o samba vai cantar no Candongueiro a partir das 18h. A roda “da casa” terá como repertório os grandes sucessos de Clara Nunes, uma forma de homenagear a cantora que, na véspera, faria 80 anos. O casal e seu filho, seguem como anfitriões. Agora, 32 anos mais velhos.

É aos poucos que o samba volta a movimentar o lugar, com apresentações a cada 15 dias. Nos últimos anos, os instrumentos se calaram. Em 2017, por problemas de documentação e atrasos do IPTU, a casa foi fechada. Quando a situação tinha, finalmente, sido regularizada, a pandemia do Coronavírus tocou a campainha.

Devagar, devagarinho, as apresentações da roda do Candongueiro foram voltando, a partir do final do ano passado. Nos áureos tempos, domingo também era dia de feijoada. A semana de programação começava na quinta-feira com gafieira e a sexta-feira poderia ser ocupada com choro, forró pé de serra ou ritmos afros. No sábado e domingo, o samba reinava.

- Quando a casa fechou a situação já não estava muito boa. Ser uma referência de samba não quer dizer que se está bem, financeiramente – conta Ivan Mendes, o filho, agora com 38 anos.

Ele é um dos integrantes da roda do Candongueiro. Toca clarinete e percussão. Seu pai, Ilton Lopes Mendes, aos 77 anos, continua fiel ao pandeiro, instrumento que, reza a lenda, passou a tocar por determinação de Clementina de Jesus. Até então,  ele tocava surdo no Vissungo, grupo de samba do qual fazia parte, na juventude.

O tom do Candongueiro sempre foi dado por Ilton. Músico, ao se mudar para a casa “na roça”, praticamente sem vizinhos, ele começou a tocar  no quintal e a convidar amigos para acompanha-lo. No repertório, só samba “raiz” ou cantigas afros.  Antes de se tornar o Ilton do Candongueiro, era conhecido como “O branco”, por ser praticamente o único branco no meio de músicos negros.

Para receber melhor os amigos, ele construiu um quiosque de sapê. O sucesso dos encontros no quintal fez com que ele começasse a planejar  a ampliação do lugar para receber o público. Comprou um terreno ao lado da sua casa e criou o terreiro que transformaria no Candongueiro.

Lá nunca teve espaço para pagode ou “samba moderno”. Foi no berço da tradição que o lugar se criou. Baluartes da Velha Guarda das escolas de samba, Beth Carvalho, Wilson Moreira, Lei Lopes, João Nogueira, Zé Keti e Aniceto do Império foram alguns dos artistas que se apresentaram na casa. Mais recentemente, nesse período de retomada, fizeram shows por lá Marquinhos de Oswaldo Cruz e Moyseis Marques. Muito dessa memória está preservada em fotos emolduradas e penduradas pelas paredes.

Moyseis Marques em recente apresentação no Candongueiro. Foto: Divulgação
Segundo Ivan, o auge do Candongueiro foi nos anos 2010, quando a casa recebia cerca de 700 pessoas por noite. Ele conta que foram os cariocas quem primeiro descobriram o lugar. Só um tempo depois, a turma de Niterói foi se chegando.

- O público de Niterói gosta de samba, mas não conhece os sambistas antigos, que são os que a gente prestigia. Houve um momento, que teve uma explosão do samba, na cidade. Em todo o lugar tinha uma roda boa. Isso aumentou a concorrência e também o cachê dos artistas. Mas um grande problema que passamos a enfrentar foi a violência. A região começou a ter muitos assaltos e a galera do Rio parou de vir. Foi um baque – conta.

No embalo do sucesso, a família apostou em ampliar seu público e abriu um bar no Jardim Icaraí. Inaugurou  em 2011 e fechou menos de três anos depois. Cercado de prédios, era impossível ter música no local sem ouvirem reclamações dos vizinhos.

Outro recado que Ilton sempre fez questão de dar para o público que fosse  à casa tinha conotação política. O espaço mais largo do terreno foi batizado Praça Che Guevara e fotos desse líder da revolução cubana ajudam a compor a decoração do lugar. Também era comum ver bandeiras como do Movimento Sem Terra (MST) tremulando pelo pátio.

- O samba sempre foi resistência. Mais do que nunca, a Cultura é uma forma de resistência, no momento em que está o país – observa Ivan.

Candongueiro costumava receber cerca de 700 pessoas, a cada dia de roda de samba. Foto: Divulgação
Ele acredita que o Candongueiro ajudou a formar público para o samba, em Niterói. Porém, a moda passou. Tanto que praticamente não há mais rodas, na cidade. Na sua opinião, quem mantém a tradição, em um pequeno circuito, é Daniel Scisinio (que é do Candongueiro), Pedro Ivo, Monica Mac e Mariana Braga, do Quilombo do Grotão.

Se não há hipótese de uma nota de modernidade musical no Candongueiro, há de ter mudanças na administração da casa. A família aprendeu, na marra, que é preciso profissionalizar os trabalhos. O período de legalização ajudou nesse processo. Ivan conta que, agora, o Candongueiro é, oficialmente, um ponto de cultura de Niterói e vai, entre outras coisas, passar a abrigar oficinas de programas do município.

Ivan Mendes cresceu em meio a rodas de samba. Foto: Sônia Apolinário
Onde tiver edital de Cultura, o Candongueiro vai marcar presença. Além disso, faz parte dos planos dar mais visibilidade ao fato de que a roda de samba da casa, desde 2019, é Patrimônio Cultural Imaterial de Niterói. Sair do “quintal” e se apresentar em outros palcos também está no planejamento da retomada.

- A nossa praia sempre foi tocar. Nunca tivemos visão empresarial. Tudo por aqui sempre foi um negócio familiar. Deu certo mesmo assim, mas podemos melhorar. Esses dois últimos anos foi muito barra pesada. A gente se virou como pode. Eu trabalhei um tempo como motorista de aplicativo. A prefeitura deu auxílio para a área cultural e eu recebi, o que ajudou muito. Penso que nós estamos nos recuperando junto com o país – comenta Ivan.

Integram a Roda do Candongueiro, além de Ilton e Ivan: Bruno Barreto, percussão e voz; Daniel Scisinio,  cavaquinho e voz; Bico Doce, cavaquinho e voz; Iracema Monteiro, voz; Marco Basilio, tantan; Dinho Rosa, surdo; Raphael Lagoas, percussão; Serginho Procópio, cavaquinho e voz.





Serviço

Memórias Ancestrais – Clara 80 anos

Roda do Candongueiro

Local: Estrada Velha de Maricá, nº 1554, em Pendotiba

Data: sábado, 13 de agosto

Horário: 18h

Ingressos: R$ 10 antecipado e R$ 25 na hora

A compra de ingressos é feita via Whatsapp: 21.72841830

Ilton Mendes entre o compositor e cantor Nelson Sargento (E) e o radialista Rubem Confeti. Foto: arquivo Candongueiro

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