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A vocação musical, impressa no DNA da cidade, ganha novo vigor com a aposta em artistas da cena independente. Esse investimento sólido reluz nos festivais que têm como premissa uma causa nobre: a revelação de talentos dos mais diversos estilos musicais, das mais diversas regiões do Brasil, numa espécie de cultura transversal que culmina em uma arte que impressiona pela sua versatilidade e pela capacidade de atrair um público pelo seu viés democrático. A pandemia da Covid foi especialmente prejudicial ao setor artístico. Para atenuar seus efeitos, foram criadas ações de estímulo às atividades culturais.
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É evidente o investimento cultural na cidade, tanto no de importar talentos, quanto no de dar espaço a artistas da cena local, a exemplo da Sala Nelson Pereira dos Santos, onde acontece o Festival Pras Bandas de Cá, que faz parte do projeto da FAN (Fundação de Arte de Niterói), criado durante a pandemia, e já passou por diversas edições. Só neste ano a Prefeitura investiu R$ 3 milhões no incentivo à cultura na cidade.
O festival Pras Bandas de Cá, criado pela Secretaria Municipal das Culturas e pela FAN com o objetivo de reduzir os impactos econômicos causados pela pandemia do coronavírus no setor artístico da cidade, teve uma primeira edição voltada apenas para artistas de Niterói, como parte do pacote de retomada das atividades culturais. O dinheiro arrecadado com a bilheteria foi todo revertido para os próprios artistas. A Sala Nelson Pereira dos Santos, no Reserva Cultural, recebeu também artistas já consolidados, como Lenine, Maria Gadu e, neste mês, será palco também do show “Sambas e Bossas” da cantora e compositora Roberta Sá, no dia 19 de agosto, sexta-feira, às 19h30.
A nova cena
Os novos ares, que já estiveram emaranhados na espinha dorsal artística da cidade, contribuíram para que Niterói se inserisse na rota dos bons shows que abraçam todas as vertentes da música popular brasileira. Só neste mês de agosto, uma série de atrações que abrangem essa nova cena será sediada em Niterói.
Nesta sexta-fera, 12 de agosto, uma artista potiguar, que tem ganho os holofotes da mídia, fará show em Niterói. A cantora e compositora, que também é diretora de teatro, Juliana Linhares, se apresenta nesta sexta-feira, às 19h, no Sesc-Niterói, no Centro da cidade, em show que integra o circuito Sesc RJ-Pulsar. Os ingressos estão a preço popular e são vendidos na bilheteria. A inteira custa R$ 10 e a meia R$ 5. O Sesc já trouxe, inclusive, recentemente, o cantor e compositor Jards Macalé.
No show do próximo dia 12, Juliana retorna a Niterói após cinco anos da apresentação com a sua banda Pietá no Teatro da UFF. O repertório alterna seu primeiro disco autoral “Nordeste Ficção”, que surgiu a partir de inquietações ao ler o livro “A Invenção do Nordeste e Outras Artes”, com releituras de clássicos, como “Galope rasante“, de Zé Ramalho e “Comentários a respeito de John”, de Belchior. Juliana adianta que vai cantar “Bombinha”, música que fará parte da trilha sonora da nova novela da Globo das 6, “Mar do Sertão”.
“Eu quero é cantar para os meus”
Como uma ode ao teatro, Juliana é atenta a todos os elementos cênicos que compreendem o palco e a performance. Em Niterói, ela traz à tona um discurso pautado na desconstrução e na possibilidade de novos caminhos, com um repertório plural que reverencia a raiz, mas que, ao mesmo tempo, ganha força no contemporâneo. Ao A Seguir, ela conta que a escolha de tocar em Niterói foi pautada em alguns critérios: a descentralização da cultura e o forte diálogo com o Rio.
– Eu tenho uma memória muito especial do último show que fiz em Niterói. Era o lançamento de Pietá na cidade e o Teatro da UFF estava lotado. Eu nunca toquei no Sesc-Niterói, mas já montei peça lá, então estou muito animada. A gente precisa ampliar, descentralizar um pouco. Se eu tenho a oportunidade de levar meu show para um equipamento cultural em outros locais, eu vou preferir. Quero entender como o meu trabalho está chegando a outros lugares. É muito valioso sair da bolha e entender como as coisas funcionam e, ao mesmo tempo, é uma delícia encontrar pessoas novas – conta.
O apreço pela cidade não é de hoje. Nas suas vindas a Niterói, ela guarda na memória afetiva o Teatro da UFF, o MAC e um lugar inusitado: o Mercado do Peixe. “Já saí de casa só para comer o peixe de lá. Tenho algumas lembranças de descer da barca, pegar ônibus e visitar a cidade. Gosto muito do pôr do sol da Boa Viagem e das praias de Itacoatiara e de Itaipu”, completa.
E em um cenário musical marcado pela inconstância e pelo grande volume de artistas, o que permanece intacto? Juliana faz sua aposta no que deve ser preservado:
– Eu acho que a integridade na relação com as pessoas. Quando você lança um trabalho autoral e chega a outros lugares, isso fica martelando o tempo todo na cabeça. Acho que esse pé no chão vem da minha família. Intacto: saber onde eu estou e quem eu sou. A luta é diária e grande. Mas ao mesmo tempo tudo se move. Tenho minhas crenças, mas é importante seguir sempre questionando – conclui.
Festival inédito, em Niterói
Nesta mesma semana, Niterói promove o Festival da Juventude, uma aposta da cidade que elenca um time de talentos da geração atual. Shows inéditos na cidade fazem parte do circuito, como a cantora pernambucana Duda Beat, que ultrapassou as barreiras do pop e do alternativo, João Bragança, outro artista expoente da cena local e figuras carimbadas de festivais como o cantor e compositor do grupo Gilsons, conhecido pela releitura de “Várias Queixas”, Francisco Gil, neto de Gilberto Gil. O festival traz ainda o rapper paulista Rael e o grupo de pagode Vou Zuar, entre outros. O evento, que será realizado no Caminho Niemeyer na sexta, sábado e domingo (12, 13 e 14) de agosto, tem entrada franca e solidária, através da doação de 1 kg de alimento não perecível. Para a programação completa, acesse o link.
O cantor e compositor niteroiense Savio, de 23 anos, que também integra o lineup do Festival da Juventude, abriu shows para nomes populares da música brasileira como Nando Reis. Escalado frequentemente para festivais da cidade, ele ressalta a importância do fomento à cultura em Niterói e o desafio de conciliar a agenda agitada de shows com os estudos na UFF:
– Estou muito empolgado! Além de ser um evento lindo e cheio de artistas que são referências para a minha carreira, vai ser demais tocar em um festival idealizado para a juventude. É super importante para nós, jovens, entendermos a necessidade do fomento à cultura. Preparamos um show com muitas músicas do meu último disco e também outras releituras de vários nomes da mpb e da nova mpb. Estou em um corre louco de conseguir me formar em História na UFF e ao mesmo tempo focar na minha carreira. Tem sido desafiador, mas tudo fica mais fácil com meus amigos, família e equipe. Falo bastante em “nós” porque, de verdade, ninguém faz nada sozinho. Por trás de mim tem uma equipe que rala diariamente para que tudo funcione e as coisas cresçam – conta.
Outro local que serviu de ponto de convergência de artistas de várias gerações é o Teatro da UFF, localizado no Centro de Artes, em Icaraí, que completa 40 anos nesta semana. O centro cultural soube mesclar, com muita precisão, formações próprias que pesquisam e difundem os vários estilos musicais, como a Orquestra Sinfônica Nacional da Universidade Federal Fluminense, o conjunto Música Antiga da UFF. o Quarteto de Cordas da Universidade e o Coro Jovem. O teatro foi ainda ponto de partida de diversos artistas e também trouxe visibilidade para tantos outros da cena independente, como o cantor e compositor Rubel, a cantora Letrux e a compositora e cantora niteroiense Rebeca Sauwen.
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