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Em Niterói, nos últimos sete anos, 19 operações policiais terminaram com 66 pessoas mortas. Isso fez com que a cidade ocupasse o quarto lugar no ranking de chacinas feito pelo Instituto Fogo Cruzado. O município fica na frente de Duque de Caxias (13 chacinas policiais e 41 mortes) e atrás de Belford Roxo (20 chacinas e 72 mortes), ambos na Baixada Fluminense.
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O Rio de Janeiro foi o município que concentrou o maior número de chacinas policiais (141) e de civis mortos (630); seguido de São Gonçalo (43 chacinas e 157 mortes).
O levantamento foi feito pelo Instituto Fogo Cruzado, entre 1º de agosto de 2016 e 31 de julho de 2023. Em todo o Rio de Janeiro, no período, 1.137 civis morreram em decorrência de 283 ações policiais.
Do total de ocorrências, 8 foram no Fonseca; 3 no Viradouro. No Caramujo e na Engenhoca aconteceram duas. As outras foram no Barreto, Sapê, São Francisco e Morro do Estado.
Somente em 2023, nos meses de janeiro e fevereiro, o levantamento registrou 11 mortes em Niterói, em decorrência de três operações: duas no Fonseca, que mataram 8 pessoas, no total, e no Viradouro, com 3 mortes.
Também foi no Fonseca a ocorrência que deixou o maior número de mortos: 6. Aconteceu em 2018, em plena Alameda São Boaventura.
No município, 2019 foi o ano mais violento, quando seis operações policiais mataram 17 pessoas.
Ocorrências em Niterói
2016
Fonseca – 3 mortos
2017
Barreto – 3 mortos
2018
Viradouro – 5 mortos
Fonseca – 6 mortos
2019
Fonseca – 3 mortos
Fonseca – 2 mortos
Caramujo – 3 mortos
Engenhoca – 3 mortos
Sapê – 3 mortos
Viradouro – 3 mortos
2020
São Francisco – 4 mortos
2021
Fonseca – 4 mortos
2022
Caramujo – 3 mortos
Fonseca – 3 mortos
Engenhoca – 4 mortos
Morro do Estado – 3 mortos
2023
Fonseca – 4 mortos
Viradouro – 3 mortos
Fonseca – 4 mortos
Na região, o levantamento registrou 70 casos que resultaram em 252 mortes. O maior número de ocorrências foi no Complexo do Salgueiro, conjunto de favelas em São Gonçalo. Foram 14 ações policiais que resultaram em 66 mortes.
Para que se tenha dimensão do que acontece no Salgueiro, as outras quatro localidades com mais chacinas são: Complexo da Maré (10 ocorrências, 51 mortos), Complexo da Penha (8 ocorrências, 55 mortos), Cidade de Deus (8 ocorrências, 27 mortos) e Vila Kennedy (8 chacinas, 26 mortos).
Foi no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, que policiais militares do 7º BPM fizeram uma festa em uma piscina a cerca de 500 metros de onde foram encontrados 11 corpos em um mangue. A festa teria acontecido na noite do dia 20 de novembro e entre a noite do dia 21 e a madrugada do dia 22 (datas de, antes e depois da chacina).
– Há décadas convivemos com uma polícia que tem na alta letalidade um indicador de eficiência. Pela primeira vez poderemos ver sistematizados os números de chacinas, que são operações altamente letais. A sociedade pode refletir se essa letalidade tornou a cidade mais segura. E pode também refletir sobre os impactos desta escolha por uma política de segurança baseada no enfrentamento e na letalidade, impactos estes que vão muito além das mortes. Vias são fechadas, o transporte público é afetado, escolas deixam de funcionar. Um dia de operação policial traz consequências físicas, mentais e muitas vezes financeiras para todos os moradores ao redor. Sofrem os cidadãos, sofre a cidade – afirma Maria Isabel Couto, Diretora de Dados e Transparência do Instituto Fogo Cruzado, que usa tecnologia para produzir e divulgar dados abertos e colaborativos sobre violência armada.
Entre as chacinas policiais mapeadas, 18 aconteceram depois que um policial foi morto ou ferido. Essas ocorrências são chamadas por moradores de “Operação Vingança”, que, segundo o Fogo Cruzado, é, em média, 71% mais letal que uma chacina policial em que não houve agente baleado. As Operações Vingança deixaram 117 mortos no Grande Rio desde 2016.
Maria Isabel Couto observa que as chacinas policiais acontecem em toda a Região Metropolitana, mas não da mesma maneira.
Na Zona Sul da capital, foram registradas apenas nove chacinas, quatro delas na favela da Rocinha. Já na Zona Norte, foram 73 casos que deixaram 373 pessoas mortas. Na Baixada Fluminense foram mapeados 72 casos, com 255 mortos.
A maior chacina registrada na história do Rio de Janeiro aconteceu na Zona Norte, no Jacarezinho, em maio de 2021. A polícia realizou uma operação que durou cerca de 10 horas e terminou com 27 mortos depois que o policial civil André Frias foi morto. A chacina do Jacarezinho é uma Operação Vingança e sua história está contada no novo levantamento do Fogo Cruzado juntamente com um perfil das demais Operações Vingança mapeadas no Grande Rio.
O Batalhão de Operações Policiais (BOPE) esteve presente em ao menos 34 das chacinas policiais ocorridas nos últimos anos. Juntas, elas deixaram 207 mortos. Isso faz do BOPE a unidade especializada mais letal em chacinas policiais, conforme os dados.
Em seguida estão o 7º Batalhão de Polícia Militar (São Gonçalo), com 33 chacinas policiais e 109 mortos; o Batalhão de Polícia de Choque (BPChq), com 26 chacinas e 121 mortos; e a Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE), com 23 chacinas e 155 mortos. Apesar de aparecer em quarto lugar no ranking das unidades , a CORE é a segunda colocada no ranking de mortes e apresenta uma média de mortos por chacina policial maior do que o BOPE – respectivamente sete contra seis mortos por operação envolvendo essas unidades especializadas.
Outro dado do levantamento é o número de chacinas em operações policiais ocorridas com a participação da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Desde 1º de fevereiro de 2018, data da primeira chacina com a participação da PRF, ocorrida no Parque Roseiral, em Belford Roxo, e que terminou com três mortos, já são 10 chacinas policiais envolvendo a unidade e que deixaram 71 mortos.
A operação ocorrida no Parque Roseiral tinha como justificativa reprimir o roubo de carga. Nenhuma carga roubada foi recuperada, mas a partir de então a PRF passou a participar de operações com outras polícias nas favelas do Rio de Janeiro.
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