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Foi pelo e-mail de seu gabinete que a vereadora Benny Briolly (Psol) recebeu mais uma ameaça à sua vida. O título da mensagem: “contando as balas”. Nele um homem diz que vai “descarregar uma arma” na parlamentar e a xinga de “aberração”. Ela registrou o ocorrido na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância, no Centro do Rio.
– Já oficiei três ameaças contando com a de domingo. Já fui agredida verbalmente na Câmara, já recebi e-mails dizendo que a metralhadora do Ronnie Lessa iria me matar – conta Benny Briolly em entrevista ao A Seguir: Niterói.
Para ela, de todas as ameaças, a mais chocante, também enviada por e-mail, foi a que chegou à sua caixa de mensagens pouco tempo depois de eleita. O agressor citava o endereço de sua antiga casa e exigia que renunciasse ao cargo, caso contrário, seria morta.
Benny não renunciou e continuou a atuar em seu mandato como planejara. A vereadora tem atuado em diferentes pautas na Câmara de Niterói. É presidente da Comissão de Direitos Humanos, da Criança e do Adolescente e apresentou projetos de lei sobre temas que defendeu na campanha eleitoral. Um deles, já aprovado, é o chamado Dandara Brum, que institui o dia 14 de maio como o “Dia Municipal de Luta e Combate ao Trans Feminicídio”.
– Dandara foi uma mulher trans, travesti, moradora do Morro do Estado, brutalmente assassinada no bairro do Centro de Niterói. A partir da aprovação do PL, anualmente, teremos campanhas, atividades e palestras com foco no enfrentamento e na erradicação do trans feminicídio, explica a vereadora.
Leia os principais trechos da entrevista:
A Seguir: Como estão seus trabalhos neste primeiro ano na Câmara de Vereadores de Niterói? Quais foram os principais projetos de lei apresentados?
Benny Bryolly: Estamos a todo vapor. Faço questão de honrar o compromisso com os mais de 4 mil eleitores que me colocaram nesta casa. Além de vereadora, também sou presidente da Comissão de Direitos Humanos, da Criança e do Adolescente e líder de Bancada do Psol na Câmara. É desafiador estar nessa cadeira, mas estou aqui para ser potência para o meu povo. Até porque, qual será o homem branco engravatado que vai se preocupar com a mãe que perdeu o filho pra violência policial ou se importar com a dificuldade que corpos trans têm de acessar espaços de saúde? Meu projeto político é por nós. No que tange aos Direitos Humanos, temos o Projeto de Lei que cria o Programa Municipal de Acolhimento às Mães e Familiares vítimas de violência do Estado, fruto de um trabalho minucioso e articulado que tem por objetivo dar atenção às mães e familiares que perderam seus entes queridos por essa violência descabida de um Estado genocida. Outro destaque também é o nosso PL Dandara Brum, que estabelece o dia 14 de maio como “Dia Municipal de Luta e Combate ao Trans Feminicídio”. Dandara foi uma mulher trans, travesti, moradora do Morro do Estado, brutalmente assassinada no bairro do Centro de Niterói. A partir da aprovação do PL, anualmente, teremos campanhas, atividades e palestras com foco no enfrentamento e na erradicação do trans feminicídio.
A Seguir: Quais Projetos de Lei de sua autoria foram aprovados?
Benny Bryolly: Até então apenas dois. O projeto de lei Dandara Brum e nosso projeto de lei que visa direcionar a pauta da Economia do Cuidado na cidade que foi sancionado. A Economia do Cuidado trata do trabalho, majoritariamente realizado por mulheres, de dedicação à sobrevivência, ao bem-estar e/ou à educação de pessoas.
A Seguir: Desde o início de seu mandato você recebe ataques. Durante a apresentação do projeto de lei que propõe cotas para pessoas trans em concursos públicos foi um deles. Recentemente, você foi questionada quando participou de um evento com alunos de uma escola pública no Quilombo Urbano Xica Manicongo. Nas redes, você denunciou este último como racismo religioso. Quais foram os principais ataques pelos quais passou como vereadora?
Benny Bryolly: São diferentes níveis de ameaças e ataques. Já fui agredida verbalmente na Câmara, já recebi e-mails dizendo que a metralhadora do Ronnie Lessa [ex-PM acusado de matar a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes] iria me matar, além desse caso de racismo religioso. No entanto, um dos casos mais emblemáticos foi a ameaça de morte que recebi através de um e-mail enviado por um grupo autoproclamado de extrema direita, conhecido pela atuação da Deep Web. No conteúdo exigiam que eu renunciasse ao cargo para o qual fui eleita, caso contrário iriam até minha casa me matar. O e-mail mencionava meu antigo endereço no Morro da Penha. Por esse motivo, fui obrigada a mudar de residência.
A Seguir: Tem tomado medidas legais contra estes ataques? Quais?
Benny Bryolly: Desde o início do mandato, temos oficiado várias instâncias: Câmara Municipal de Niterói; Secretaria de Direitos Humanos; TSE – Tribunal Superior Eleitoral; Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão – Ministério Público Federal Procuradoria Geral da República e Programa Estadual de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos. Organizações da sociedade civil também estão acompanhando tudo desde dezembro e cada vez mais preocupadas. Dentre elas, Terra de Direitos; Justiça Global; Anistia Internacional; Instituto Marielle Franco e Criola. Com a minha saída do país [em maio de 2021], fui incluída no Programa de Proteção a Defensores e Defensoras de Direitos Humanos. Já oficiei três ameaças contando com essa de domingo (19).
A Seguir: Como vereadora, quais são as perspectivas e planos para 2022 na luta contra o racismo?
Benny Bryolly: Para 2022, eu espero o fortalecimento e a garantia de corpos como os meus nos espaços de decisão. Não quero ser travesti eleita sozinha. Quero mais de nós ocupando as cadeiras, escancarando as portas e renovando o quadro político. E além disso, que tenhamos segurança e proteção para redirecionar as pautas e radicalizar a política brasileira.
A Seguir: E no geral, quais são os planos de trabalho?
Benny Bryolly: A forma que me organizo é origem do chão da favela, do pertencimento, de ter a realidade que vivi de acordar com tiroteio. Costumo dizer que a vida de pessoas pretas, travestis e faveladas é interrompida pela ausência de políticas públicas. Por isso, entendo minha ação política como um chamado para guerra. Eu fui eleita a mulher mais votada da cidade, tenho um compromisso com as mais de 4 mil pessoas que confiaram em nosso projeto político e não vamos retroceder. Meu plano é construir uma cidade confortável e justa que priorize a demanda do povo preto e da comunidade LGBTIA+. O ano de 2022 será muito importante para a política brasileira. É hora de radicalizar a democracia brasileira. Aqui na Mandata de Favela, já estamos organizando o mês de janeiro que é um mês muito importante pra nós: mês da visibilidade trans e mês de combate à intolerância religiosa. Vamos fomentar PLs e eventos de conscientização para abrir o ano com chave de ouro.
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