18 de janeiro

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Museu Antônio Parreiras de portas abertas em Niterói

Por Sônia Apolinário
| aseguirniteroi@gmail.com

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Coube a descendentes do pintor, o antigo dono da casa, cortar a fita que, simbolicamente, reabriu as portas do local, nesta quinta-feira (16)
museu antônio parreiras aberto
O Museu Antônio Parreiras fica no Ingá. Foto: Leitor

Com expressiva presença de moradores de Niterói, o Museu Antônio Parreiras, no Ingá, foi reinaugurado nesta quinta-feira (16). Coube a descendentes do pintor, o antigo dono da casa, cortar a fita que, simbolicamente, abriu as portas do local, após mais de dez anos fechado.

A trineta de Antonio Parreiras, Lúcia Guimarães, cortou a fita inaugural. Fotos: Sônia Apolinário

Primeiro museu de arte do estado do Rio de Janeiro e primeiro, no Brasil, dedicado à memória de um artista, o Museu Antonio Parreiras foi inaugurado em 1942. A reabertura se deu após parte do local passar por reformas. As intervenções contaram com uma obra de restauro completa no edifício principal que, agora, está pronto para voltar a receber exposições abertas ao público. O  investimento, do governo do estado, foi de R$ 2,4 milhões.

Além do edifício principal, o equipamento cultural também é composto por outros dois prédios, incluindo o ateliê de Antônio Parreiras e a Vila Olga, onde se encontra o acervo técnico, que também serão reformados. Essa segunda etapa das obras ainda não tem data para ser realizada. O projeto foi orçado em R$ 6 milhões e prevê, entre outras coisas, a implantação de um elevador.

A cerimônia de reinauguração contou com a participação da secretária de estado de Cultura e Economia Criativa, Danielle Barros, e do presidente da Funarj, Jackson Emerick, entre outros. O prefeito de Niterói, Rodrigo Neves, não compareceu porque, no mesmo horário, estava na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, para entregar, para o Comitê Olímpico do Brasil, o dossiê da postulação conjunta de Niterói e Rio como cidades sede dos Jogos Pan-Americanos e Parapan-Americanos de 2031. Neves foi representado pelo secretário das Culturas, Leonardo Giordano.

– Moradores de Niterói desejavam a reabertura do museu. Eles acompanharam, fiscalizaram, incomodaram, porque também é preciso incomodar para que as coisas aconteçam. A casa de Antonio Parreiras foi comprada para atender uma reivindicação da população de Niterói. Agora, temos o dever de ocupar o museu – disse a secretária Danielle Barros, que brincou: – Agora, esse é o museu mais bonito de Niterói, lançando uma “provocação” em relação ao MAC.

Para a diretora do museu, Fátima Marotta Henriques, a reabertura representa uma “vitória para Niterói”. Pode ser também considerado como um presente de aniversário póstumo para Antonio Parreiras que completaria 165 anos na próxima segunda-feira (20).

A reabertura do museu marcou também a inauguração da exposição “Antônio Parreiras: memórias e histórias”.

A restauração, até o momento, contemplou o edifício principal do museu. Foto: divulgação

Descendentes

Foi a trineta de Antonio Parreiras, Lúcia Guimarães, quem cortou a fita simbólica da reinauguração do museu. Ao seu lado estava a prima Tina Scorzelli, que foi à cerimônia acompanhada de seus três netos. Todos são moradores de Niterói.

– Nossas mães nasceram na Vila Olga. Elas conviveram com Antônio Parreiras até os dez anos de idade. Elas nos contavam que morriam de medo dele porque ele era muito bravo. Quando estava pintando, ninguém podia entrar no atelier – contou Tina.

Para Lúcia, a reabertura da casa representa “uma conquista”:

– Saber que o sonho de Antônio Parreiras está vivo é importante – disse ela.

Daniel (E) e Davi: a quinta geração de Antônio Parreiras e o quadro preferido.

Segundo Tina, seus netos sabem quem foi Antônio Parreiras e sentem orgulho dele. Ela contou que Daniel, de 8 anos, atualmente, está na dúvida se será pintor ou jogador de futebol, quando crescer.

Já David, de 6 anos, “desenha muito bem”, da mesma forma que Bia, de 4 anos.

– Ela adora desenhar. A mesa dela é cheia de lápis – disse.

Em um determinado momento, a família se sentou junta para observar alguns quadros. Daniel apontava para uma das telas e fazia comentários com a avó. Para o A Seguir, ele informou que era seu quadro preferido da exposição, no que David disse que a mesma obra também era a sua preferida. O motivo da preferência, as crianças não souberam explicar.

– Eu só gosto – disse Daniel.

Visitantes

Tão logo a cerimônia oficial de reabertura do museu terminou, uma longa fila se formou na porta de entrada da casa. Eram, na sua maioria, moradores de Niterói que fizeram questão de ir logo visitar o local, após tanto tempo fechado.

Morador de Piratininga, o pintor e escultor Arthur Silveira Netto, de 73 anos, estava feliz e emocionado. Quando criança, ele era vizinho do museu e costumava brincar por lá.

– Esperamos muito por esse momento. Eu costumava entrar lá em cima, onde fica o ateliê (área atualmente interditada) e brincava muito por aqui. Olho para o piso e lembro dele. A gente costumava entrar na casa de pantufa. Foi uma fase bonita da minha infância, perto do museu. Agora, acho que tudo na casa está mais lindo – contou.

Mário Reis, que também é pintor, contou que há muitos anos, chegou a fazer uma exposição na primeira sala do museu, logo na entrada (onde ele se encontrava, enquanto conversava com o A Seguir).

– Toda uma geração de artistas de Niterói foi influenciado por Antônio Parreiras. Ele saía com sua mala e pintava o natural. A paisagem era valorizada naquela época, mas, de uns tempos para cá, ficou um pouco abandonada. Fiquei emocionado ao entrar aqui outra vez. A casa ficou maravilhosa – disse ele, que tem 74 anos.

Sua esposa Elizabeth lembrou que o casal, durante vários anos, foi vizinho do museu. Atualmente, moram em Icaraí.

– O museu fazia muita falta – disse ela.

A psicóloga paulista Cinthia Lopes, de 55 anos, mora em Niterói há cerca de um ano. Ela confessou que nunca tinha ouvido falar de Antônio Parreiras. Ao saber sobre a reinauguração do museu, ficou curiosa para conhecer o artista. E foi na casa, após passar a tarde em uma oficina, no museu Janete Costa, pertinho dali.

– De cara, achei a casa linda e o jardim maravilhoso. Agora, vou conhecer esse artistas de Niterói – disse ela.

Exposição

“Antônio Parreiras: memórias e histórias” é formada por 27 obras do acervo do museu de forma a revelar a trajetória de Antonio Parreiras. Reúne pinturas e desenhos que passaram por um processo de conservação, restauro e higienização.

O visitante é convidado a percorrer um circuito autobiográfico, traçado a partir de um livro escrito pelo próprio Antônio Parreiras, publicado em 1926. A tecnologia entra em cena para que essa história seja contada pelo próprio pintor. Ao aproximar o celular de um QR code, é possível ouvi-lo narrar trechos do livro, relacionados, de alguma forma, com a obra em questão. A voz que o visitante escuta é, na verdade, de dois tataranetos do artista.

A exposição pode ser visitada até 13 de abril, de quarta a domingo, das 12h às 17h. O Museu Antônio Parreiras fica na Rua Tiradentes, 47, no Ingá.

Antônio Parreiras

O retrato do pintor Antônio Parreiras (detalhe), (Numa Camille Ayrinhac 1907) faz parte da exposição.

Nascido em Niterói em um momento em que a produção intelectual no Brasil passava por fortes influências de debates europeus, em seus vários textos redigidos, deu força a um discurso heroico quando referia-se à classe média, de onde veio. No entanto, após a morte de seu pai, foi à falência.

 

Foram várias as experiências do artista, sem sucesso, até que, em 1883, o então escriturário da Companhia Leopoldina, em Nova Friburgo, matriculou-se na Academia Imperial. Ingressar no universo artístico aos 23 anos de idade era considerado tarde para a época.

 

Insatisfeito, em 1884, deixou de fazer parte da Academia para pintar d’après nature na cidade de Niterói junto ao núcleo formado pela inspiração do pintor alemão Georg Grimm. Este, formado em Munique, chegou ao Brasil em 1874 e foi descrito por Parreiras em sua autobiografia como “extremamente bondoso para com os pequenos, altivo e arrogante, violento até para os grandes”. Influenciado pelos ares alemães de Grimm, pintar paisagens ao livre, romper com as instituições da academia era uma opção de vida a Parreiras.

 

Quando não mais fazia parte da Academia, o pintor preferiu seguir por rumos alternativos e então passou a organizar exposições próprias, grande maioria delas acontecia dentro de sua própria casa, em Niterói.. Acredita-se que a arte de vender suas próprias produções tenha sido mais uma das muitas influências da convivência com os ideais de Grimm. A venda de suas pinturas obedecia uma filosofia comunitarista, em que os ganhos de todos sustentavam a compra de mantimentos e materiais de trabalho para uso comum.

 

Em 1886, uma de suas exposições próprias recebeu uma importante visita que seria fundamental para o reconhecimento de Antônio Parreiras como artista e, principalmente, pintor. Dom Pedro II não só visitou a exposição do paisagista niteroiense, mas também adquiriu duas obras do pintor.

 

O sucesso de Parreiras é, para muitos, motivo de estudo e análise profunda. Principalmente por sua inserção no embrionário mercado de artes que se formava entre os século XIX e XX no Brasil. O pintor, por boa parte de sua vida, obteve sustento proveniente da venda de suas obras, num momento em que o mercado de arte ainda era instável e incipiente.

 

Em 1927, Antônio Parreiras participou da inauguração de um busto em sua homenagem, esculpido em bronze pelo francês Marc Robert e exposto no Jardim Icaraí, atual praça Getúlio Vargas, em Icaraí, em Niterói. 

 

Hoje, suas obras históricas podem, em sua maioria, ser encontradas nos museus de arte e história do Brasil afora ou até mesmo na decoração de algumas das sedes de governo do país.

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