COMPARTILHE
O enorme anseio de participar do processo democrático tomou conta, desde cedo, de Icaraí, maior zona eleitoral de Niterói. O que se vê nessas eleições é uma manifestação tímida dos petistas em alguns locais, que pode ser explicada pelo medo de represália. Percorrendo o bairro, no entanto, era possível observar, em algumas zonas, um cenário mais polarizado. Eram poucas as pessoas que iam votar numa espécie de manifestação plena (blusa, calça da cor do seu candidato e adesivos por todo o corpo). O que ganhou destaque nessas eleições, em Icaraí, foi a escolha de pelo menos uma peça ou acessório que representasse seu candidato. As filas imprimiam o retrato de que se trata de um grande momento que, inclusive, pode ter o resultado logo no primeiro turno, de acordo com algumas pesquisas.
Leia mais: O futuro do Brasil nas urnas
Em alguns pontos de votação, a fila dava volta no quarteirão. E o que se ouvia era um burburinho de que há quatro anos atrás, a impressão era de menor concentração de pessoas. Alguns diziam: “Que fila é essa? Nas últimas eleições eu cheguei essa hora e não estava assim. Passava nem perto. Que horror!”. O que confundia era se as filas foram provocadas pela falta de organização de alguns locais ou se de fato mais pessoas decidiram comparecer às urnas e cumprir seu dever cívico, que resistia, em muitas das vezes, a verdadeiros testes de paciência.
Teste de paciência
Maria dos Anjos, aposentada, de 89 anos, foi votar na reitoria da UFF logo cedo. Levantou um pouco antes das 7h, como de costume, animada para votar no seu representante, uma conquista que ela tem consciência do seu valor. Foi acompanhada do seu filho. Ao chegar à reitoria, por volta das 8h30, foi surpreendida pela pequena fila. Mal sabia ela o chá de cadeira que a aguardava.
Sua seção 394 foi premiada pela falta de sorte. Isso porque logo quando chegou a sua vez de votar a urna apresentou um problema. Até então não se tinha ideia do quanto demoraria para substituí-la. Só depois de mais de uma hora, algumas voltas no jardim e uma conversa extensa com seu filho para passar o tempo, ela foi convocada para votar. A urna chegou às 9h30 e voltou a funcionar às 9h40. Ao sair da cabine, foi aplaudida pelas pessoas que estavam na fila, que reconheceram a sua resiliência, num clima que remete à primeira enfermeira vacinada contra a Covid: “Saí muito mais feliz do que entrei”, afirmou, ao deixar a UFF.
Filas longas, mas pacíficas
As filas se confundiam na Igreja Santuário e no Colégio pH, na Rua Álvares de Azevedo, por volta de 10h30/11h da manhã. Quem votou no Santuário na seção 261 levou cerca de duas horas para concluir o processo. Muitos eleitores não faziam ideia – ou faziam e deixaram para última hora – que o número da seção tinha mudado. O resultado foi uma fila imensa de desorientados, pessoas furando fila e um descontentamento difícil de disfarçar. No fim das contas, houve uma sobrecarga enorme de determinadas seções, enquanto em outras, não se levava 15 minutos, e o dever já estava cumprido.
A leitura da biometria foi outra queixa constante dos eleitores. Em algumas seções o esquecimento da “colinha” com o número dos candidatos atrasava a fila. Chegou ao ponto de pessoas de diversas faixas etárias saírem perguntando os números de seus candidatos. A resposta dos mesários vinha em coro: “Infelizmente, não há nada que eu possa fazer para ajudar”. Muitas pessoas também observaram que os mesários não pediam o celular no momento de entrar na cabine, como determinado pelo TSE.
A fila dobrava o quarteirão e apesar de muitos não manifestarem suas opiniões, num comportamento mais retraído, havia aqueles que carregavam bandeiras, usavam faixas, brincos com estrelas, blusa da seleção. Amarela e verde, só azul, mas principalmente amarela. Havia, ainda, aqueles que usavam a blusa da seleção, com o adesivo do candidato do PT. Algumas pessoas foram votar de moto com a blusa do Brasil, numa espécie de homenagem ao atual presidente da república. Apesar de muito polarizado, o clima dessas eleições era harmônico. O estranhamento não passava da troca de olhares, alguns julgamentos, e insatisfações com o candidato oponente, mas não ia muito além.
No Clube Central, na Praia de Icaraí, a fila também era assustadora, desde muito cedo. O clube, que tem mais de 15 seções, é reconhecido por ser um dos locais de votação que mais lota em época de eleição. O clima lá era de muito anseio, por um lado, e por outro, muito verde e amarelo, principalmente por parte dos idosos.
O apoio ao candidato petista vinha, em alguns momentos, em detalhes: na echarpe vermelha que envolvia o pescoço, no colar, no boné, no sapato. Ou optava-se por uma roupa de cores que não representem os candidatos atuais, mas com adesivos. Situação similar à vivida em 2018, quando muitos não assumiam votar no Bolsonaro. Agora, por medo da violência, há pessoas que preferem não arriscar e optam por se isentar de qualquer posicionamento político, pelo menos em época de eleição.
No colégio São Vicente, na Rua Miguel de Frias, a fila também era grande. Às 11h30/12h, próximo à hora do almoço, pessoas se amontoavam na expectativa de votar. O clima, apesar da polarização, notável no local, era de tranquilidade e respeito à divergência política.
As filas não davam trégua. Na Escola Municipal Julia Cortines, na Lopes de Trovão, as filas estavam imensas e percorriam o interior e o exterior da escola por volta das 14h.
Apesar de alguns gritos de “Fora Bolsonaro” e “Mito”, não houve, ao menos pela manhã nenhum ato violento. Niterói tem 405 mil eleitores e mostrou com a campanha e a inscrição de eleitores jovens, que não são obrigados a votar, uma enorme vontade de participar do processo democrático.
COMPARTILHE