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De brinquedos a sanduíche, bancas de jornal são as novas lojas de conveniência de Niterói

Por Sônia Apolinário
| aseguirniteroi@gmail.com

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Bancas de jornal da cidade podem se tornar locais de apoio gratuito para ciclistas
banca de jornal abre
Banca em Icaraí: chinelo, bijuteria, brinquedo e até jornal. Fotos: Sônia Apolinário

Onde é possível encontrar, em Niterói, em um mesmo lugar, produtos como, por exemplo, boné, bolsa, meia, chinelo, bijuteria, biscoito, bala, refrigerante, sanduíche, sorvete, brinquedos, incenso, cigarro ou até charuto? Em uma banca de jornal, é claro.

São cerca de 120 delas, espalhadas pela cidade – mas já foram mais de 200. Ampliar o leque de produtos oferecidos foi a forma como o tradicional segmento encontrou para contornar a vertiginosa diminuição do interesse por jornais e revistas impressos, em tempos de internet.

Algumas coisas, porém, não mudaram muito com o tempo. Banca de jornal é, na sua grande maioria, um negócio que passa de pai para filho e uma verdadeira “cachaça” para quem é do ramo. Há quem torça o nariz para as chamadas bancas modernas, que podem medir até 15 metros quadrados, por considerar que ocupam muito da calçada e atrapalham a circulação. Entre os jornaleiros, há também quem ache que nem todos trabalham direito, ou seja, não exibem jornais e revistas que devem ser vendidos, por lei, para não descaracterizar o negócio.

A Seguir Niterói visitou algumas bancas de jornal e conversou com seus donos. Juntos, compõem um mosaico atual do segmento, na cidade.

Centro

Entre a estação das barcas e o terminal Rodoviário Presidente João Goulart funcionam cerca de dez bancas de jornal, bem perto uma das outras. O niteroiense Ricardo Mantuano, de 60 anos, é dono de uma delas há 40 anos. Ele conta que nem sempre a concorrência foi assim tão próxima. A construção do terminal rodoviário é que acabou deixando as bancas da região “emboladas”.

Apesar dos pesares, ele diz que, hoje, aquela área do Centro da cidade está melhor do que há dez anos, “quando era uma verdadeira bagunça”.

– A vida toda trabalhei na banca. É de família. Começou com meu avô e passou para o meu pai. Meus irmãos têm outra banca na Amaral Peixoto. Revista vendia muito, mas a internet estragou com as vendas. Então, oferecer produtos variados foi importante para atrair movimento – afirma ele que mantém sua banca aberta das 5h às 20h e divide o expediente com outro irmão.

Banca perto da estação das barcas pertence à mesma família há duas gerações

Ricardo conta que, primeiro, começou a vender refrigerantes. E que, “no início”, cerveja tinha muita saída. Porém, há três anos, a venda da bebida é proibida em bancas de Niterói (no Rio de Janeiro é permitido). Atualmente, o produto que ele mais vende é cigarro (proibido de ser vendido em bancas do Rio).

O critério para a escolha dos produtos que vende na sua banca é simples: o que mais agradar o público.

– Tudo é consignado. O que tiver saída vai ficando – explica ele.

Um dos vizinhos de Ricardo é Ailton Rosa. Nascido em Alcântara, morador de São Gonçalo, ele trabalha em bancas de jornal desde os 12 anos. Foi seu primeiro emprego. Naquela época, sonhava em, um dia, ter sua própria banca. E conseguiu. Ao todo, já está há 38 anos no ramo.

Ailton conta que preferiu investir em Niterói por considerar um mercado melhor do que no município onde mora. Assim, desde 2000, está no Centro da cidade, onde trabalha diariamente das 6h às 22h. Ele conta que, atualmente, o produto que mais vende é mangá.

– Eu vivo de revista e não de tabacaria. Vendo muitos livros também. Não vou abrir mão da leitura. Tem muita banca que nem exibe jornal ou revista e isso é ilegal – afirma.

Foi há dez anos que ele começou a ampliar a oferta de produtos com balas e refrigerantes. Atento às necessidades do público, passou a ter serviço de Xerox e a fazer entregas. O vai e vem de pessoas apressadas não o impede de conhecer muitos clientes pelo nome. Alguns nem precisam falar nada – é só chegar perto da banca que ele entrega seja a revista, o cigarro, o refrigerante ou a bala que o cliente costuma comprar – às vezes, apenas só empresta o isqueiro para que acedam um cigarro, um serviço gratuito comum às bancas da cidade.

Agora, sua meta é ampliar e melhorar seu delivery. Ailton acredita que as pessoas, cada vez mais, estarão em busca de comodidade e ele quer se preparar para atende-las e seguir prosperando nos negócios.

No Centro de Niterói, jornaleiro aposta em serviços como xerox e delivery

 

Origens

Até 1998, banca de jornal só podia vender jornal, revista e ficha de telefone. De lá para cá, as regras mudaram e todos esses produtos oferecidos, atualmente, têm venda permitida, com a condição que os jornais e as revistas não sumam das prateleiras e expositores.

De acordo com Adalmir Ferreira da Silva, diretor da Associação de Proprietários de Bancas de Jornais (Aproban), as bancas ficarão cada vez mais parecidas com uma loja de conveniências. Ele conta que a cidade de Curitiba foi a grande inspiração para o atual modelo de bancas adotadas em Niterói. Por sua vez, a cidade paranaense se inspirou na forma como o segmento atua em Portugal.

No Brasil, a história das bancas de jornal tem sotaque italiano. Acredita-se que o nome “banca” vem do nome do primeiro jornaleiro a montar um ponto físico de venda de jornais, no Rio de Janeiro, o imigrante italiano Carmine Labanca, que se instalou no Centro da cidade. As primeiras bancas fixas datam do início do século 20.

Em Niterói, o pioneiro foi Pietro Polizzo, que começou na atividade vendendo jornal nos sinais de trânsito e chegou a ter centenas de bancas – há quem diga que perto de 500.

O pai de Adalmir, já falecido, trabalhou por 18 anos para Polizzo (que ainda é vivo) até conquistar suas próprias bancas – que hoje estão distribuídas pelos três filhos.

Adalmir é dono de três, em Niterói, nos bairros de Icaraí e Santa Rosa. Aos 37 anos, começou a trabalhar aos 9 para ajudar o pai. Por conta disso, passou a infância e adolescência acordando por volta das 3h da madrugada. Formado em Administração de Empresas, hoje ele acompanha de perto o movimento de suas bancas, mas conta com auxílio de um gerente e funcionários “com carteira assinada”, como ele diz.

– Quando a internet começou, muita gente não aguentou. Quem estava no negócio por estar, saiu. Nós persistimos. Meu pai era apaixonado pela banca e eu também sou – afirma.

Nem sempre as bancas foram de ferro, como as atuais. Já foram de madeira e, no início da atividade, não eram presas no chão, até que começaram a ser roubadas. De acordo com Adalmir, ainda hoje, segurança é o maior desafio do segmento.

Bike in Banca

Como em qualquer negócio, administrar uma banca requer estratégias de comercialização e marketing. Como explica Adalmir, se os jornaleiros vendem produtos parecidos, terão que se diferenciar seja no horário, seja na forma de atendimento. A Aproban dá o norte para o exercício da atividade, mas a palavra final é de cada jornaleiro.

Ele conta que tinha 12 anos quando deu a ideia para o pai de informatizar as bancas da família. Agora, ele vai começar, pelas suas, a implantar algumas novidades, que espera que sejam adotadas pelos colegas, em toda a cidade. A principal delas é a Bike in Banca.

A ideia de Adalmir é transformar as bancas de jornal em locais de apoio para ciclistas. Isso significa que elas terão ferramentas e bombas para encher pneu disponíveis, gratuitamente. É de bicicleta que ele se desloca pela cidade e já sentiu na pele a falta que pode fazer o empréstimo de uma bomba de ar. Ele também pretende distribuir saquinhos para socorrer donos de pets que são pegos desprevenidos quando seus animais fazem “necessidades” nas ruas.

Uma de suas bancas de Icaraí vai ganhar, em breve, placas para captação de energia solar. Adalmir conta que seu objetivo com a iniciativa  é fazer economia. O local funciona 18h por dia e rende uma conta de luz de aproximadamente R$ 2 mil, por mês.

Uma das bancas de Adalmir (no centro), na rua Otávio Carneiro em frente ao número 100, em Icaraí

Concessão

A lei garante a hereditariedade das bancas de jornal, mas esse serviço é uma concessão da administração municipal. Assim, qualquer pessoa pode entrar para o ramo. O ponto de partida é fazer um pedido junto à Secretaria Municipal de Urbanismo e Mobilidade. O candidato informa o lugar onde quer atuar e a SMU aprova ou não, em função de onde há ou não banca (ou espaço) disponível para a atividade ser explorada.

Uma banca deve ter, no mínimo, 4 metros quadrados e, no máximo, 15 metros quadrados; pode ocupar até metade de uma calçada, desde que o espaço tenha 3 metros de largura.

Em sites de compra e venda de objetos usados, uma banca pode custar entre R$ 2 mil e R$ 6 mil. Já uma banca nova sai em  média por R$ 20 mil.

De acordo com Adalmir, no momento, não há informação de que tenha alguma concessão de banca de jornal disponível em Niterói. Mas pode vir a ter, em função do planejamento da cidade.

– Uma banca só termina quando acaba o mercado em volta dela. Enquanto houver movimento na rua, espírito de vizinhança, haverá banca de jornal. Uma banca aberta dá sensação de segurança para o local. Nós jornaleiros conhecemos o movimento do bairro, seus moradores. Muitas vezes, nos fazem de psicólogos. Perdi a conta de quantas garrafas de café ganhei dos clientes que moravam bem ao lado da banca do meu pai onde eu trabalhava. As bancas podem mudar os produtos que vendem, mas elas carregam um espírito de coletividade que não vai mudar – afirma Adalmir.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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