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Condições desiguais impactam educação de estudantes do ensino público

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Jovens de Niterói relatam o impacto da desigualdade no acesso à internet durante o período letivo on line
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A realidade encarada pelos estudantes no ensino remoto. Foto: Larissa Moura.

Por David Lucas Vaz, Larissa Moura e Zuri Moura,
Agência Jovens Comunicadores

Um direito Humano. É assim que a ONU enxerga o acesso à internet. No Brasil, a pandemia expôs ainda mais a dificuldade, quando os estudantes ficaram totalmente dependentes do ensino on line, por mais de um ano. Quem não tem recursos, equipamentos e uma boa conexão de internet ficou para trás nos estudos. Um fator que vai agravar ainda mais a desigualdade de oportunidades entre a educação pública e a escola privada.

Nesta reportagem, David Lucas Vaz, Larissa Moura e Zuri Moura, da Agência Jovens Comunicadores, em parceria com o A Seguir: Niterói, mostram os impactos da pandemia na educação. A investigação que mergulhou no universo do jovem nas comunidades mostra que a situação trouxe agravantes sociais nas periferias brasileiras, como o desemprego, a insegurança alimentar e a violência policial , entre outras questões; somadas aos problemas pessoais de cada aluno e da família envolvida.

Como estudar? Quem me ajuda?

“Eu não estava preparada psicologicamente para lidar com isso”, diz Maria Clara, de 15 anos, que terminou o ensino fundamental no meio da pandemia pelo sistema EAD (ensino a distância). Moradora de São Gonçalo, a jovem cursa o ensino médio dentro deste mesmo cenário. A diferença é que precisou deixar os colegas e a instituição privada onde estudava, por razões financeiras, para entrar no ensino público estadual no ano de 2021.

Maria Clara Rabello, 15 anos. Foto: Arquivo Pessoal.

A estudante relata que “já tinha dificuldade para entender algumas matérias no ensino presencial e no ensino à distância só piorou. Eu praticamente tive que me virar sozinha. Ano passado, apesar da dificuldade com esse método, eu ainda tinha mais oportunidade de conseguir entender as matérias, porque eu tinha aula online, tinha apostilas, os professores explicavam e eu podia tirar dúvidas.”

Este ano, Maria Clara sente que a situação está ainda pior. “Ser aluna nova torna tudo mais complicado, e não tenho aula, não tenho explicação, não tenho contato com os professores e nem com os alunos”, diz. A plataforma que ela nos mostra, em sua casa, permite apenas ler as apostilas online e fazer os exercícios.

No início de maio, a jovem teve a possibilidade de voltar às aulas no sistema híbrido. Mas logo na primeira semana um estudante teve a confirmação do contágio pela Covid-19. O ensino à distância voltou a ser a única opção.

A família também não apoia o retorno à sala de aula com medo da exposição. “A escola não tem preparo”, diz a mãe, Marluce Rabello. “Álcool em gel e medidor de temperatura, quando tem, não é o suficiente”, concluiu a mãe.

A estudante conta que quando ela não possuía uma rede de internet de qualidade ela tinha aulas online, atualmente quando ela possui uma melhor não tem os encontros virtuais no formato de aula.

As lembranças do tempo do convívio físico na escola antiga são boas. “Lembro da feira cultural e dos jogos olímpicos. Era uma oportunidade de conhecer melhor o contato com outras pessoas, me dava motivação para aprender”. Hoje a jovem fala da desmotivação para estudar e da ansiedade em relação ao futuro.

Quando questionada sobre os impactos da pandemia na sua vida estudantil, a jovem diz sobre suas dúvidas e uma certeza: “eu ainda não sei o curso que eu quero fazer, mas eu quero cursar a faculdade, porque eu acredito que a educação é a única forma para eu ter um futuro melhor.”

“Antes da pandemia eu já tinha problema de ansiedade, com a pandemia isso piorou, principalmente por conta de tudo o que estamos vivendo no país e no mundo, e eu ainda tenho que me preocupar com os meus estudos porque é sobre o meu futuro e a minha vida.” concluiu a estudante.

O debate sobre o tema não se pauta exclusivamente no desafio de ter ou não ter uma estrutura de qualidade para o estudo na Internet. Especialistas chamam atenção para os agravantes sociais, como a violência policial nas periferias brasileiras, o desemprego, a insegurança alimentar, dentre outras questões; somadas aos problemas pessoais de cada aluno e da família envolvida.

As lembranças do tempo do convívio físico na escola antiga são boas. “Lembro da feira cultural e dos jogos olímpicos. Era uma oportunidade de conhecer melhor o contato com outras pessoas, me dava motivação para aprender”. Hoje a jovem fala da desmotivação para estudar e da ansiedade em relação ao futuro.

Quando questionada sobre os impactos da pandemia na sua vida estudantil, a jovem diz sobre suas dúvidas e uma certeza: “eu ainda não sei o curso que eu quero fazer, mas eu quero cursar a faculdade, porque eu acredito que a educação é a única forma para eu ter um futuro melhor.”

O agravamento das desigualdades

O debate sobre o tema não se pauta exclusivamente no desafio de ter ou não ter uma estrutura de qualidade para o estudo na Internet. Especialistas chamam atenção para os agravantes sociais, como a violência policial nas periferias brasileiras, o desemprego, a insegurança alimentar, dentre outras questões; somadas aos problemas pessoais de cada aluno e da família envolvida.

Fonte dos dados: Diretoria de Pesquisa e Estudos de Acesso à Justiça da Defensoria Pública do Rio. Arte: David Lucas Vaz

Desde 2011, a ONU já inclui o acesso à internet como um direito humano. Desse modo, cabe analisar a desigualdade brasileira no acesso à internet, principalmente entre pessoas de baixa renda e estudantes de escolas públicas. Neste contexto pandêmico tal questão foi acentuada, pois escancarou as desigualdades entre os brasileiros em relação à educação e ao acesso à internet.

A vivência dessas pessoas é transformada em algo invisível. Estão segregadas socialmente no território. E participar de um ensino digital de qualidade acaba sendo definido pela classe social.

Segundo a Defensoria Pública do Rio de Janeiro alguns pontos são essenciais para um bom aprendizado remoto, tais como: acesso a dispositivos de comunicação, acesso à internet, acesso a livros ou apostilas e uma boa capacitação dos profissionais envolvidos.

Sonhos interrompidos

A Jovem Comunicadora Júlia Maia, de 17 anos, relata a vivência dela em Niterói, também estudante da rede pública estadual. Julia era bastante engajada em projetos de sua escola, integrava o grêmio estudantil e atuava também na organização de eventos culturais.

Um dos sonhos da jovem é cursar Cinema e Audiovisual na UFF. Porém, faltou um recurso essencial para tornar este sonho uma realidade. Ela conta ter tido problemas com o acesso à internet. Assim, não conseguiu participar da forma engajada como fazia antes do ensino remoto. E ainda se viu tendo que trabalhar para ajudar o pai.

A estudante foi despreparada para o ENEM 2020 e, infelizmente, não conseguiu uma boa colocação no vestibular.

Julia conta com orgulho das suas realizações antes da pandemia: “em 2016, produzi um filme de curta metragem no Hora de cinema-CEGUIB (Colégio Estadual Guilherme Briggs), e em 2017 o meu grupo concorreu a um festival de cinema em Ouro Preto-MG, e nós conseguimos apresentar nosso trabalho neste festival”.

Julia Maia, 17 anos, Jovem Comunicadora. Foto: Arquivo Pessoal.

No momento, Julia participa da Agência Jovens Comunicadores – filiada à BemTv. “Apesar de não estar cursando Cinema e Audiovisual, eu dei a volta por cima, e estou trabalhando nesta área, eu consegui correr atrás do meu; mas ainda estou lutando para ingressar na universidade pública” relatou a jovem.

Julia e Maria Clara são apenas dois exemplos entre os 54% dos alunos da rede estadual do Rio de Janeiro, que tiveram problemas com o acesso à internet.

Muitos estudantes não conseguem se adequar a essa nova modalidade de ensino. Sentada numa cadeira desconfortável e diante da mesa improvisada para o estudo, uma das jovens diz o que qualquer estudante seria capaz de desabafar:

– É irritante, estudar em casa tira a atenção, parece que estou de férias e fico desanimada de aprender, eu não estava preparada psicologicamente para lidar com isso.

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