22 de dezembro

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Chef Bruno Marasco fala dos seus 21 anos de trajetória no Da Carmine

Por Livia Figueiredo
| aseguirniteroi@gmail.com

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Referência em culinária italiana em Niterói, o chef se considera um italiano papa-goiaba e fala dos desafios do momento: “o futuro é agora”
cozinha
O chefe Bruno Marasco em seu restaurante Da Carmine / Foto: Divulgação

Um recanto da Itália em Niterói. É assim que o chef Bruno Marasco define seu restaurante, que agora completa mais de duas décadas desde a inauguração na cidade. A vinda para Niterói foi uma escolha de um lugar definitivo para viver. Bruno passou quase dez anos em um navio de cruzeiro e, depois que se formou na Itália, foi estudar na França e na Inglaterra para, em seguida, trabalhar num transatlântico.

-Eu costumava dizer que a minha vida cabia numa mala. Eu me movimentava muito e estava um pouco cansado disso. Queria encontrar meu porto-seguro – conta.

O chef diz que o Brasil sempre foi seu sonho e, como seu irmão, Carmine, já estava morando em Niterói, foi tudo uma questão de tempo. Fascinado pela cultura brasileira, ele confessa que escutava Tom Jobim e Vinícius Moraes sem entender nada do que estavam cantando e lia Jorge Amado em italiano para, mais tarde, ler no original. Bruno brinca que foi uma imigração por opção: “Estava fugindo não sei do quê.”

Em entrevista ao A Seguir: Niterói, o chef Bruno Marasco, do restaurante Da Carmine, conta das suas raízes, da sua conexão com a cultura brasileira, dos desafios impostos pela nova realidade e dos seus planos para o futuro.

A Seguir: Niterói: O que você carrega em seu DNA italiano para o Brasil?

BRUNO MARASCO: Eu carrego a minha alma (risos). Não há como se desligar. Quando cheguei ao Brasil, eu trouxe comigo 32 anos de vida, de experiência. A questão de viver em outro país não cancela automaticamente o interior. Só vai enriquecendo. A minha sorte é que o brasileiro possui uma grande afinidade com o povo italiano, então eu fui muito bem acolhido e, de certa maneira, prosperei e fui reconhecido cidadão honorário niteroiense, coisa da qual me orgulho. Tem uma máxima que eu costumo dizer: sou um italiano papa- goiaba.

Você começou a trabalhar ainda garoto em um vilarejo da Calábria, em Santa Ágata, ajudando seu pai na lavoura. O que você traz dessa experiência?

Eu tenho uma saudade imensa do meu pai. Carrego até hoje comigo os ensinamentos quando íamos às montanhas para catar cogumelos e quando fazíamos o próprio vinho. A gente esperava ele amadurecer nos barris e, depois, o trabalho verdadeiro: preparar os recipientes de vidro para tirar o vinho do barril. Além do aprendizado de como preparar a terra, adquiri também a paciência de cuidar para somente depois colher os frutos. Esses são ensinamentos que você traz para a vida.

A sua vocação para a gastronomia é resultado de uma paixão interna genuína somada aos valores passados pelo seu pai?

Sim, é um conjunto. Acho que me ajudou a entender lá na frente os frutos de um trabalho de uma pessoa que se dedica. A paixão para transformar isso tudo vem também da minha mãe, das freiras, porque eu estudei em colégio católico. Quando eu terminava o estudo antes dos outros, me colocavam no refeitório para cozinhar junto com as freiras. Isso quando eu tinha 9/10 anos.

Você se definiu como um italiano papa-goiaba. O que gosta de fazer aqui na cidade? O que te encanta?

Infelizmente, não tenho muito tempo para me dedicar às praias, gostaria muito. Mas é importante para mim pensar que o mar está lá, acessível. O que eu faço é ir à praia de Icaraí para tomar uma água de coco depois que fecho o restaurante. Sento lá e contemplo o outro lado da baía. Curto muito o trabalho dos meus colegas e admiro a peculiaridade de Niterói. É uma cidade única. Não à toa é definida como cidade sorriso.

Quais são as suas preferências na culinária?

Eu costumo dizer que gosto do pastel ao foie gras (e tudo que está no meio disso).

Quais são os principais desafios que você enxerga no momento?

Desde que nasceu o Da Carmine, o grande desafio sempre foi o crescimento da empresa. E eu diria que conseguimos, pois damos muito valor a nossa história como família. Com a pandemia, o desafio passa a ser outro. Tudo mudou e tivemos que nos reinventar. Nós fomos dormir com uma situação e acordamos em outra realidade. Não houve um período de treinamento, de adaptação para essa nova mudança. O Da Carmine tem quase 130 funcionários. Tentamos não demitir ninguém, mesmo diante de uma situação extremamente complicada. A gente sente a dor de cada família do nosso colaborador. Os nossos valores não são só empresariais, são valores fundados na família, pois somos uma empresa familiar.

Como ficou a questão do delivery? Houve um aumento do número de pedidos?

A gente tinha apostado num crescimento do delivery e isso não se concretizou na sua amplitude. Nós logo pensamos: “as pessoas vão estar em casa, precisam se alimentar, então vamos entregar comida a elas”. Mas o pessoal está em casa e precisa se ocupar de certa maneira. Qual é uma possibilidade de fazer isso? Cozinhando sua própria comida. Então, houve esse ponto que não foi computado da nossa parte. O delivery, que representava 15% do nossa faturamento total, seguiu o mesmo percentual. O crescimento foi irrisório, mas isso aconteceu com outros restaurantes também.

Tonnarelli com camarão ao sugo, novidade do cardápio / Foto: Divulgação

Para driblar isso, quais foram as alternativas pensadas?

Logo pensamos: “temos um limão, então vamos fazer uma limonada.” A gente começou a fazer lives na nossa página do Instagram ensinando a cozinhar os pratos mais simples. Fizemos isso por quase dois meses. No primeiro, as lives eram quase diárias. No segundo mês, orientamos a como melhor se alimentar em um período de isolamento social. Ensinamos a fazer fettuccine, gnocchi, pão e seus variados cortes, conversamos sobre fermentação, algumas dicas de como comprar pão. Por exemplo, o macio do pão branco é um perigo, porque, caso contrário, ele vai fermentar no seu estômago. O tempo do cozimento é importante. O pão tem que ser moreno, pois significa que ele já foi previamente assado. A vida toda é um processo. Não adianta excluir uma etapa, porque não vai funcionar.

Vocês voltaram com o espaço físico do restaurante em agosto. Como foi esse retorno? Quais foram as principais adequações ao novo cenário?

O novo normal, na verdade, para nós não é nada de extraordinário, pois sempre seguimos o protocolo das boas práticas. Já fazia parte da nossa rotina. A higienização das mãos é fundamental. A gente já observava a possível contaminação cruzada dos alimentos. O que mudou foi os atendentes passarem a utilizar máscaras e o distanciamento das mesas. Mas, por exemplo, alguns manipuladores de alimentos já utilizavam máscaras normalmente. Então, tivemos que tomar outros cuidados, como pedir para os clientes utilizarem máscaras quando forem ao banheiro, higienizar corretamente as mãos.

Vocês acabaram de lançar uma novidade no cardápio que consiste numa massa feita com brócolis. O que você destaca desse prato?

Aqui no Brasil se diz que tudo acaba em pizza. Na Itália, falamos que tudo acaba em pasta. A ideia é trazer um pouco desse sentimento. Explorar a qualidade dos vegetais para introduzir aquilo que é uma liga fantástica de farinha e ovos. Então, você tem uma base para fazer tudo que quiser. É preciso conhecer a elasticidade dos amidos de uma farinha que possa conferir uma textura e manter junto à fibra de um vegetal como o brócolis. Isso, depois de um cozimento, dá uma textura fantástica realmente. É o início de um projeto de fazer massas com vegetais que se prestam para um casamento saudável com a farinha de trigo especial e importada. O prato tem diversos formatos, temos a versão vegetariana também, que é só a pasta de brócolis, temperada com alho e brócolis. A pasta também pode ser servida acompanhada de uma proteína, tem a versão com camarão, que é uma maravilha, também pode servir com um guisado de carneiro. Pode ser acompanhada de queijo também.

Nessas duas décadas, o que você destaca de peculiaridade do povo brasileiro?

Uma coisa engraçada é que quando eu cheguei ao Brasil, eu servia ravióli recheado de abóbora. Então, uma vez um casal me chamou à mesa. O maître tinha me falado que eles estavam inconformados com o prato e queriam conversar comigo. Chegando lá, perguntei o que tinha acontecido. E a resposta foi: ravióli de abóbora, mas cadê a carne seca? Porque aqui no Brasil abóbora e carne seca é um casamento, você não pode separar. É o Romeu e Julieta. Não pode servir a goiabada sem o queijo.

O que você planeja para o Da Carmine nos próximos anos? Vocês têm o Empório Del Gusto, onde vendem massas, pães, sorvetes feitos por vocês, não é isso?

O Empório Del Gusto praticamente revende os produtos que são utilizados no restaurante Da Carmine. Criamos um espaço à parte para esse serviço. Em Icaraí fica ao lado do restaurante, já na unidade de Itaipu, pelo seu espaço maior, comporta vender no mesmo ambiente. Nós temos uma linha de confeitaria italiana, onde vendemos doces, sorvetes, uma linha extensa de panificação também. Em relação ao futuro, estamos trabalhando nele. O futuro é agora. Estamos em fase de entender como poderia ser, mas com certeza não será igual ao trabalho de antigamente. Temos que encontrar novas fórmulas de estímulo ao consumo. Vamos focar em propor aquilo que pode ser considerada uma experiência italiana. A gente realiza uma vez por mês a Domenica della Felicità, um evento em que gastronomia e música ao vivo se conectam. Ele tem como intuito promover a experiência da Itália não só em âmbito gastronômico, mas no cultural também. E qual seria a melhor maneira senão através da música?

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