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A escuridão pairou sobre o bloco no condomínio onde moro, por mais de 24 horas entre a segunda-feira, 7, e a terça-feira, 8. Das 10h30 da manhã de ontem até 12:30 da manhã de hoje para ser mais exato. Fomos os únicos, em meio a oito prédios do condomínio, no Gragoatá, a sofrer um apagão causado por um curto circuito no transformador do bloco. Para mim, jornalista que depende da energia para trabalhar, a situação foi caótica, mas para alguns vizinhos foi ainda pior.
Às 15h, a primeira equipe da Enel que havia chegado para resolver o problema horas antes, deixou o condomínio prometendo voltar mais tarde com uma equipe especializada. Assim como outros vizinhos, dependo do computador e da internet para trabalhar. Ficar tanto tempo sem luz significou perder prazos, atrasar entregas e depender do 4G do celular para qualquer tarefa que envolvesse o meu trabalho.
Por ser a minha única ferramenta, obviamente a bateria do celular me abandonou à noite, e tive que ir para o hall de outro bloco para carregar o celular – horas ali, esperando a energia voltar, sem previsão e vendo o segundo caminhão da Enel ir embora sem resolver o problema por volta das 23h, segundo eles, um curto circuito no transformador do bloco impedia a restauração da luz, portanto o transformador só seria trocado no dia seguinte por uma outra equipe.
Como também trabalho fora de casa e tive que ir à faculdade onde me formei, subi e desci oito lances de escada três vezes. O elevador, obviamente, estava parado. Por sorte, a geladeira já estava quase vazia antes da compra do mês. Perdi o que restava, mas poderia ter sido pior.
Mas, eu não fui o único. Conversei com vizinhos que também ficaram nessa mesma situação. E cada relato é um retrato do que muitos moradores de Niterói têm experimentado com as seguidas falhas no fornecimento de energia e demora nos consertos da cidade.
Carla Felix é professora e, como muitos profissionais hoje, precisa da internet para dar aulas, interagir com alunos e preparar conteúdos. “Pra mim, além das dificuldades que todo mundo enfrentou (banho gelado, comida estragando, subir e descer com garrafas d’água, porque o filtro é elétrico), não consegui trabalhar direito. Minha filha dá aulas particulares online, perdeu clientes e dinheiro. Hoje, no meio da minha aula de espanhol, a bateria caiu. E eu não tinha como recarregar”, contou.
Já Renata Maia, enfrentou o caos com duas crianças. Para ela, o calor e a grande quantidade de mosquitos tirou a noite de sono entre ontem e hoje. “Estou no trabalho exausta, com dor de cabeça. Cochilei só de manhã. Meu filho perdeu a aula. A comida de ontem estragou. E ainda estou esperando uma resposta da ouvidoria da Enel por causa de danos causados por um pico em março. A empresa diz que ‘não houve perturbação’, mesmo com protocolos registrados por mim e pelos vizinhos”, disse Renata.
Para Caio Mello, o problema da falta de energia é uma insegurança constante. “Tenho dois gatos. Eles bebem água em fonte e comem com dispenser. Fico com medo de sair e faltar luz. Trabalho home office, e essa insegurança de não saber se vai ter energia complica tudo.”
O aniversário de cinco meses da filha de Analice Martins foi marcado pelo apagão. “Quando cheguei em casa às 15 horas, estava um calor infernal, minha filha chorando de calor e sem conseguir dormir”, contou a moradora, que disse pagar altas contas de luz justamente para mitigar o calor.
A falta de previsão de retorno e o não cumprimento de horários pela equipe da Enel a obrigaram a buscar refúgio com a família na vizinha São Gonçalo. “Peguei nossas coisas e fomos dormir na casa da minha prima, em São Gonçalo, onde não falta luz toda hora como aqui”.
No final da madrugada, o casal retornou ao condomínio às 5h carregando bolsas, computadores, mamadeiras e a neném de 5 meses, mas às 11h da manhã, a luz ainda não tinha voltado. “Meu marido se atrasou para o plantão dele e eu não posso parar de trabalhar, então fiz meus prazos pelo 5G do celular e torcendo para a bateria do notebook aguentar”, contou. Segundo ela, nada foi pior do que a preocupação com a bebê, que chorou a madrugada toda.
A crise energética em Niterói não é um problema recente. Em novembro de 2024, o então prefeito Axel Grael determinou que a Procuradoria Geral do Município ingressasse com uma ação judicial contra a Enel, exigindo a normalização imediata do fornecimento de energia elétrica na cidade. Essa medida visava assegurar o cumprimento do plano de contingência previamente apresentado pela concessionária, diante das constantes falhas que afetavam não apenas os moradores, mas também serviços essenciais como escolas e unidades de saúde.
Não adiantou. Em Niterói, o histórico da Enel é marcado por quedas de energia frequentes. No condomínio onde moro, esse foi o quarto apagão em uma semana, mas nunca o tempo sem luz havia sido tão longo. Dessa vez, em um condomínio inteiro, apenas um bloco apagado por mais de 24 horas.
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