21 de dezembro

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Andanças

Por Giovanni Faria

Giovanni Faria é jornalista com mais de 30 anos de atuação em jornais e rádios do país, professor universitário e um andarilho pelo mundo. Já percorreu mais de 5.500 KMs em 11 viagens pelo Caminho de Santiago de Compostela. Nasceu em Nova Friburgo, mas é frequentador assíduo das ruas de Niterói, onde mora e caminha diariamente por todos os cantos da cidade.
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O prazer suado de subir o Parque da Cidade

Parque da Cidade

O velho Fiat 147 até que largou bem. Encarou os primeiros metros em terceira marcha, depois segunda, enfim primeira. Mas se lascou na curva fechada. Engasgou, pigarreou e, por fim, parou. Uma ladeira intransponível para aquela lata velha. Faltou fôlego, faltou tração, faltou força, faltou tudo. O motorista puxa o freio de mão (esse não faltou, ainda bem), desce do carro, coloca pedras atrás das rodas para que a máquina não despenque e sinaliza, não com um triângulo, mas com um verdejante galho de árvore. E, por fim, sacramenta com uma certa dose de arrogância e ironia, num diálogo improvável com seu possante:

– Você não sobe, tudo bem. Fique aí. Eu vou subir a pé – bradou o motorista, agora travestido de caminhante, arfando morro acima.

Subir o Parque da Cidade, sobre rodas ou sobre pés, não é para qualquer um. Já vi carro pedir arreglo, ciclista dar meia volta, pedestre sentar na calçada à espera do resgate. São apenas cerca de dois quilômetros, da base ao topo, com 300 metros de altimetria. Em tese, dá para chegar lá. Mas é preciso um mínimo preparo físico. E calma, claro.

Mas que o Parque da Cidade é a joia da coroa niteroiense, disso não tenho dúvida. Para quem adora caminhadas, chegar ao topo é uma espécie de consagração, dá até para sentir uma hipotética medalha pesar no peito. O cansaço desaparece em segundos, o suor seca em instantes, o corpo passa a ter na visão seu foco central. Os olhos ficam arregalados.

Sentar na rampa de salto de parapente, asa-delta ou qualquer outra traquitana voadora e apreciar a paisagem é o momento em que uma velha palavra de minha geração volta a fazer sentido depois de tantos anos e décadas: desbunde!

Ter Niterói e tantos cartões-postais do Rio sob seus pés cansados é uma sensação única e divinal. E sentir-se grande, imenso, gigante por instantes, ao mesmo tempo em que revelamos toda a nossa pequenez diante do universo.

Ponha esse desafio na sua vida: subir o Parque da Cidade, se possível e de preferência, a pé. Lá, descanse. Deite na rampa, estique as canelas nos bancos e espreguiçadeiras, admire a paisagem e a si próprio. Até, pecado quase venial, feche os olhos por instantes. As belezas embaraçam a (minha) visão, como canta Chico em “As vitrines”.

Duro mesmo é descer. Nem corpo nem alma querem ir embora. Mas se vão, enfim, para voltar de novo a qualquer dia. Afinal, como um íma, o Parque da Cidade nos atrai. Portando, deixe-se ser abduzido.

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