A questão das barcas Rio-Niterói é reveladora de uma situação que, se não é nova, vem ganhando proporção cada vez maior na vida das cidades. A interconexão dos municípios, o território alargado pela experiência urbana de morar, trabalhar e viver numa determinada região, mais do que numa cidade.
Pode-se dizer que sempre foi assim. Niterói, pela proximidade do Rio, sempre gravitou em torno da capital. Primeiro, capital federal, depois capital do estado. Nem a condição de capital do antigo estado do Rio mudava este papel, embora a cidade exercesse maior influência em relação a outros municípios do estado, especialmente do Leste Fluminense. Desde a fusão, esta influência desapareceu e o que prevalece é a conurbação, o conjunto de municípios vizinhos que conformam a Região Metropolitana II. Nela, aparecem São Gonçalo, Itaboraí e Maricá. Em contraposição à Região Metropolitana I que agrega a partir do Rio toda a Baixada Fluminense.
Esta situação expressa mais que uma nomenclatura geográfica: define uma região que compartilha recursos e acessos. Conhecemos bem o problema. Boa parte do movimento das barcas Rio-Niterói, por exemplo, não é de moradores de Niterói, mas de São Gonçalo e cidades vizinhas. Assim como a frequência de bares, restaurantes e praias de Niterói é em grande medida ocupação de moradores de outras cidades.
Niterói, que historicamente, vivia o congestionamento da Ponte Rio-Niterói, num fluxo bem definido, que refletia o movimento de casa para o trabalho, agora vive um engarrafamento permanente em função da população de outras cidades que trabalha, busca escolas, atendimento médico-hospitalar e serviços e lazer por aqui. Anos atrás, seria difícil entender que no sábado a cidade engarrafa no sentido do Rio e São Gonçalo para Icaraí e Regiões Oceânicas, um fluxo então inexistente.
A compreensão desta realidade é fundamental para a adoção de políticas públicas. Sem entendê-la, vamos repetir os mesmos erros. A intermunicipalidade cria uma zona cinzenta, que agrava o problema, uma vez que a gestão das soluções se divide entre municípios, estado e o governo federal. A política tem demonstrado que Niterói não conta com este suporte, a não ser às vésperas das eleições.
Neste sentido, a decisão de assumir a questão da tarifa social das barcas de Charitas, um recurso para desafogar o trânsito da Região Oceânica, integrando o BRT e as barcas, é um acerto da prefeitura e inaugura, de certa forma, uma nova visão da gestão pública. Os problemas de Niterói, Niterói deve resolver. Pressionando outros poderes, mas liderando o processo. Como também se desenha em relação à segurança. No caso, Rio e Niterói cansaram de esperar o socorro de Castro e de sua política orientada para a captura de votos na Baixada. Bom começo.