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Lupulinário

Por Sônia Apolinário

Sônia Apolinário é jornalista tendo trabalhado nos principais jornais do país, sempre na área de Cultura. Também beer sommelière, quando o assunto é cerveja e afins, ela se transforma na Lupulinário.
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Niterói tem uma única mulher à frente de fábrica cervejeira

Foto: Divulgação

No mercado cervejeiro de Niterói, uma única mulher comanda duas fábricas ao mesmo tempo. A engenheira química e beer sommelière  Ingrid Matos chegou na Masterpiece em maio de 2020. Naquela época, a produção mal havia começado, sem direito a festa de inauguração da empresa, por conta da pandemia do Coronavírus.

De lá para cá, ela já criou 90 receitas e ajudou a marca a conquistar 18 medalhas para seus rótulos. Quando a Joint Operation entre a Masterpiece e a cervejaria Máfia se concretizou, ela se viu à frente de duas fábricas. Em Niterói, não há outras mulheres no controle de fábricas cervejeiras.

Agora, Ingrid comanda duas equipes distintas e alterna seus dias entre as duas cervejarias, sempre calçando suas icônicas botas cor de rosa.

Joelho de moça

Natural de Ipatinga, no interior de Minas Gerais, ela chegou a Niterói aos 28 anos, depois de dois anos à frente da fábrica da cervejaria Verace, em Belo Horizonte (MG) e oito meses na Mistura Clássica, em Angra dos Reis (RJ). O convite para assumir a fábrica da Masterpiece foi feito pessoalmente pelo CEO da marca, André Valle. Até então, ele vinha trabalhando com a consultoria de Wagner de Paula.

Quando chegou de Angra, ela foi morar em São Francisco, mas há dois meses se mudou para Icaraí. Naquela época, em entrevista para Lupulinário, ela admitiu que mal podia esperar para ir à praia, sonho de todo mineiro.

“Até hoje, só fui em Camboinhas. Gostei tanto quando fui a primeira vez, que acabei não indo nas outras, mas irei. Ainda serei uma ótima guia das praias de Niterói”, afirma Ingrid.

Para se “redimir”, ela conta que já ingressou para a legião de fãs do sanduíche natural do Marcelo (só vendido nas praias) e pede (agora) sem hesitar, um italiano na lanchonete – na sua cidade, o salgado se chama joelho de moça.

“No começo, tive que me controlar para não cometer uma gafe. Percebi que era uma verdadeira afronta para um niteroiense chamar o salgado de joelho”, conta.

Foi a oportunidade de morar em um imóvel maior que a levou para Icaraí. Agora, ela “bate ponto” na feira de artesanato do Campo de São Bento aos sábados pela manhã. E se distrai vendo as lojas do bairro, uma vez que, em São Francisco, praticamente só tem bares.

Ingrid (na foto, de roupa vermelha) admite que, no momento, seu xodó, é a equipe que montou para trabalhar na fábrica da Máfia, formada apenas por mulheres:  Camila Lopes (abaixada), “importada” de Belo Horizonte, e a niteroiense Fabíola Maciel (blusa verde).

Foto: Divulgação

Na Masterpiece, ela comanda uma equipe masculina, que também criou. É formada pelos niteroienses Alexandre Lima (blusa azul) e Allan Silva (segurando o troféu), além do argentino Matias Micci (que não está na foto) que Ingrid tirou de outro setor da empresa e levou para a fábrica.

“Amo trabalhar com os rapazes, absolutamente nada contra eles, mas, na Máfia, somos só nós mulheres. A gente levanta sacos de malte, moi, tira o bagaço, carrega e descarrega o que for. É uma equipe 100% feminina porque há mulheres no comando em outros setores também. Estou apaixonada por essa equipe. Gosto da organização feminina”, afirma Ingrid.

Agora que “ganhou” equipes, ela está um pouco mais livre para tocar outros projetos para as marcas. No momento, finaliza a cerveja feita com lúpulos nacionais, uma outra em homenagem ao Dia da Mulher e desenvolve o projeto de produções colaborativas de cervejas ácidas. Também acompanha de perto o desenvolvimento do novo e-commerce para envio nacional dos rótulos, a ser feito todo em cadeira refrigerada, além da expansão dos bares das marcas.

Atualmente, a produção da Masterpiece é de 10 mil litros por mês. Como diz Ingrid, por lá, a panela sempre está quente. De todos os projetos, ela fala com ainda mais empolgação sobre a cerveja com lúpulos nacionais.

“Optamos por fazer uma Hop Lager porque a ideia é dar brilho total para o lúpulo nacional, permitir que as pessoas percebam as características do lúpulo brasileiro. É outra coisa trabalhar com lúpulos tão frescos. A safra de 2022, por exemplo, chegou para mim em cinco dias. É todo um universo novo. Vamos desenvolver receitas para esses lúpulos e, aos poucos, passar a usá-los nas nossas cervejas de linha”, explica.

Ela conta que, quando chegou em Niterói, tinha uma grande expectativa em relação ao novo trabalho, apesar do período de muita incerteza, por conta da pandemia. Hoje, Ingrid afirma que suas expectativas foram “superadas em muito”, apesar da pandemia ainda estar no ar. Tanto que, mais uma vez, a sonhada festa de inauguração da Masterpiece ficou para algum outro momento – seria em 23 de março.

Na opinião da mestre cervejeira, a principal mudança no mercado das artesanais, nesses dois anos, foi o delivery e a “descoberta” do growler (recipiente feito com diferentes tipos de materiais usado para encher de chope para delivery).

“A praticidade de receber o chope em casa criou novos hábitos de consumo em um público que não tinha muito o costume de sair. Eram pessoas que acabavam não tendo muito acesso às novidades. Agora, o pessoal está bebendo melhor, em casa”, observa.

Segundo Ingrid, dentre todas as cervejas já lançadas, três não podem faltar, em hipótese alguma: a Red Ale, a English Pale Ale e a Brut Ipa.

Botas cor de rosa

O uso dessas botas, na fábrica da cervejaria, é mais do que um simples gosto pessoal “fashion” de Ingrid. Pink Boots é um movimento em prol das mulheres cervejeiras.

A Pink Boots Society é uma organização com atuação internacional, sem fins lucrativos, cujo objetivo é apoiar mulheres ou pessoas não binárias que atuam no meio cervejeiro, especialmente na criação de cerveja artesanal. Em 2022, completa 15 anos de fundação.

Ingrid conta que, até agora, em todas as fábricas por onde passou, foi bem acolhida. Ela diz que já se acostumou (e não se importa mais) quando recebe aqueles olhares de incredulidade quando chega para trabalhar com suas galochas cor de rosa. É verdade que, em pleno 2022, as pessoas ainda não estão muito acostumadas com mulheres em fábricas de cerveja, ainda mais no comando. Quebrar o “gelo”, segundo Ingrid, é a primeira tarefa a ser executada. E seguir em frente.

Reprodução rede social

 

 

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