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Luiz Cláudio Latgé

Jornalista, documentarista, cronista, atuou na TV Globo por 30 anos, como repórter, editor, diretor. Consultor em estratégia de comunicação, mora em Niterói e costuma ser visto no Mercado de São Pedro.
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A difícil volta à vida normal

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De repente, começaram as cobranças. Bastou a cidade abrir um pouco, as atividades voltarem ao normal, o trabalho, o comércio, bares e restaurantes… até o catamarã voltou a funcionar… e a gente começa a ser caçado como devedor do Banco Inter em ligações de telemarketing. Não há refúgio. Depois de um ano e nove meses de pandemia, não há mais como escapar das obrigações vencidas. “Agora não tem desculpa para não fazer.”

Tipo, consertar a porta que range, trocar a lâmpada da escada, que está um perigo, limpar o filtro do ar condicionado, porque, mesmo com o aquecimento global, o verão está chegando… Parece que tudo desabou ao mesmo tempo. Procure encontrar um pedreiro, pintor ou um eletricista neste período de retomada.

A lista é maior: atualizar a carteira de motorista, os documentos do carro, acertar pendências bancárias, negociar milhas e passagens vencidas, reclamar de produtos que não foram entregues… Tenho uma relação enorme de brigas com fornecedores. Só com a Oi tenho anotado: cobrar o segundo ponto, que nunca foi instalado, reclamar que a super hiper fibra é uma carroça, desligar o telefone fixo que antes devia estar instalado num presídio, de tanta gente que procuram por dívidas pendentes.

Nem falo de todos os cursos on line que a gente se inscreveu, e grupos de literatura e música, e escolas de línguas. Nesse ponto há uma certa condescendência, tipo, estamos juntos, passou, não se fala mais nisso.

Visitar parentes em Juiz de Fora, comprar toalhas novas na Tok Stock, levar sapato velho na Belisário…

O momento é mais grave do que fazer lista de fim de ano. Aquelas promessas que nunca se vai cumprir. A promessa tem uma coisa lúdica, uma vontade de fazer direito. Mas não é uma obrigação. Até Iemanjá sabe que não é  para valer. Não, agora não são desejos; são dívidas.

Botar os exames em dia, cuidar  da pressão, emagrecer… Emagrecer é o pior de tudo. Não pelo esforço, em si, porque, por mais que a gente resista, sabe que só tem um jeito… Na verdade dois: comer menos (o que inclui beber menos) e fazer exercícios. E aquela voz no ouvido: “Agora não tem desculpa para não fazer.”

Depois de tanto tempo de restrições, é claro que ninguém está em forma, protegido pelo isolamento e pelas máscaras. “Te vi outro dia na rua, você engordou. Aonde? Em São Francisco? De máscara branca? Não era eu… a minha é verde.” Não tem desculpa, as academias voltaram a funcionar.

O problema é o personal. Não é com você, Murilo, é um problema meu, entenda. Começa pelo bom dia. O cara não vê tempo ruim. Vai te torturar, esticar, torcer, fazer pular e aparece assim todo animado. Mais rápido, estica mais, mais forte, mais alto… E você bufando. Mas de certa forma me adaptei, entendo, faz parte. Ruim mesmo, beirando a depressão, é quando começo a travar nos exercícios e ele percebe minha dificuldade e quer me dar apoio moral. Isso, isso, tá puxado, tá intenso. Você mal levanta a perna, geme e ele sai com essa: intenso! Intenso!  Consigo virar o pescoço para a direita e lá vem de novo, como se tivesse subido o Evereste: Intenso, intenso!

A sorte é que o ano está acabando. Prometo que em 2022 tudo vai ser diferente.

 

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