“Foi o caso que 60 anos atrás fui morar em Niterói…”
“Meus contraparentes, os Paraíso, moravam na Rua Lopes Trovão, em face do Parque de São Bento. Eu achava o parque uma beleza: com seu lago e suas árvores”.
“Andando uns quatro quarteirões eu ia toda manhã tomar banho de mar em Icaraí. Ali ainda não havia nenhum edifício: era tudo casa de moradia. Havia um simpático trampolim de madeira que depois foi substituído por um de cimento, que depois sumiu”.
“A água era limpinha e muitas vezes, com amigos de praia, eu dava uma nadada até o Canto do Rio ou até a Praia das Flechas, passando por fora da Itapuca. Eu tinha uma boa resistência para nadar, o que não era muita vantagem, porque andava pelos 15 anos de idade. Um cara lá chegou a dizer que ia arranjar para eu entrar de sócio atleta do Clube Icaraí, sem pagar nada; lá eu poderia treinar para participar da prova da travessia da Guanabara a nado. Isso foi já em 1929, mas aí tive uma sinusite, e adeus atleta. Em 1929 eu já cursava a Faculdade de Direito do Rio (Rua do Catete), mas continuava a morar em Icaraí.”
“Lembro-me que àquela altura todo mundo se queixava do péssimo serviço de barcas da Cantareira; eu não dizia nada, mas achava ótimo; sempre tinha prazer em navegar na ida e na volta, com sol ou chuva. Em 1930 continuei no Catete e na Lopes Trovão, e só em 1931 me transferi para a Faculdade de Belo Horizonte, onde já estava meu irmão Newton. Assim, durante dois anos e meio, eu fui, a meu jeito, fluminense; meu retrato está lá, em quadro de formatura, no casarão do Salesiano de Santa Rosa, com aquela beca emprestada e aquela cara de pateta.”
“E de tudo isso, e outras coisas que aconteceram depois, ficou em mim um grande carinho por Niterói. Não cheguei nunca a atravessar a Guanabara a nado; não tive nunca namorada nenhuma no Parque de São Bento, nem na Praia de Icaraí. Eu era um rapazinho feio e tímido, que lia Bilac e começava a ler Manuel Bandeira. Mas a imagem das árvores na lagoa do parque, as mansas ondas de Icaraí e o perfil distante das montanhas do Rio, tudo isso se associou em mim a traumas sentimentais que me atingiram forte, mas que a beleza e a suavidade de Niterói me ajudaram a sofrer”.
Não por acaso a crônica “Um rapaz de Niterói” está na seleção do livro “As boas coisas da vida”, de Rubem Braga, lançado em 1989 pela Record. Viver em Niterói, mais de 90 anos depois do período passado por Braga na cidade, continua sendo uma das boas coisas da vida.
O menino capixaba, de Cachoeiro de Itapemirim, morou dois anos e meio em Niterói. Veio para estudar no Salesiano porque tinha sido expulso do colégio de sua cidade e foi morar com parentes em Icaraí. A beleza e a suavidade de Niterói, como escreveu o cronista, o ajudaram a superar a mudança, a separação dos pais, a nova realidade.
Escolhemos Rubem Braga para falar de Niterói não apenas porque ele viveu aqui. O jornalismo e a literatura sempre caminharam juntos. “Vidas Secas”, “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, “O Ateneu”, entre tantos outros, são clássicos da literatura publicados primeiro em jornais. E o jornalismo mundial teve e tem grandes literatos em suas páginas, como no caso dos jornais cariocas o próprio Rubem Braga, Carlos Drummond de Andrade, Nelson Rodrigues, Verissimo ainda hoje… Não dá para citar todos.
O A Seguir: Niterói faz jornalismo como quem escreve uma crônica diária, acompanhando a vida da cidade onde nasceu em maio de 2020. Era o começo da tragédia da pandemia de Covid-19, mas tivemos o privilégio, como o cronista, de ter Niterói para nos “ajudar a sofrer”.
Viver em Niterói está entre as boas coisas da vida. Caminhar pela Praia de Icaraí e admirar o contorno das montanhas no Rio, subir o Costão de Itacoatiara, atravessar a Baía de Guanabara de barca, a imponência das fortalezas junto ao mar, as trilhas nas montanhas com vistas deslumbrantes do Atlântico… E, mais recentemente, o maior conjunto de obras do genial Oscar Niemeyer, que começa a ser desenhada no Centro e vai exibindo suas curvas pelos bairros, atravessando a cidade, até Charitas…
Em Niterói beleza não é fundamental. É real, está à vista de todos, é gratuita. “Eu não tenho nada a ver com isso. Nem sequer nasci em Niterói” escreveu Vinicius de Moraes ao falar de uma tristeza que tem um pouco a ver com os dias de hoje. Mas em Niterói “tudo vale a pena quando a alma não é pequena”.
E não dá para se ter alma pequena, como diria o poeta português Fernando Pessoa, quando se vive por aqui. Há versos de Pessoa nas paredes do restaurante Seu Antônio, no Cafubá, um quintal com mesas junto a árvores e o melhor da culinária portuguesa por nossas terras. Sabores que também se encontra no Dona Henriqueta, no Caneco Gelado do Mário…
Como os portugueses, estão por aqui os italianos (e não joelhos!). Niterói tem gastronomia, tem sol, tanto mar, florestas, parques, oferta cultural, alto índice de escolaridade e renda.
E em meio a tanta coisa boa para “ajudar a sofrer”, não podia deixar de ter problemas, como o trânsito pesado, a violência, a poluição das lagoas, o desempenho aquém do esperado na educação apesar de nadar em águas tranquilas nas finanças graças à sua economia e aos royalties do petróleo.
Mas aí já é outra história. História que você acompanha diariamente aqui, no A Seguir: Niterói. Sempre em defesa de seus leitores e de sua cidade.
Itaipu, Icaraí, Itacoatiara, Itapuca… Não por acaso bairros, ruas e monumentos naturais de Niterói têm nomes indígenas. Remetem à origem da cidade, a única do Brasil fundada por um índio, o cacique temiminó Arariboia. Em tupi-guarani, Niterói significa “águas escondidas”.
E que outra cidade tem três datas gravadas no seu brasão? No de Niterói se encontram os anos de 1573, 1819 e 1835. Uma é a data oficial da fundação da cidade; a outra remete ao ano em que passou à condição de Vila, com o nome de Vila Real da Praia Grande; e a terceira é o ano em que de fato virou cidade. Decreto da Prefeitura de 10 de março de 1909 estabelece como data oficial de fundação da cidade de Niterói 22 de novembro de 1573.
A tribo de Arariboia, catequizada pelos jesuítas, vem do Espírito Santo, na frota de Estácio de Sá, para combater franceses e tamoios no Rio de Janeiro em 1564. Arariboia já havia adotado o nome cristão de Martim Afonso de Souza, em homenagem ao donatário português.
Com a vitória sobre os invasores, Mem de Sá, governador geral, decidiu manter os guerreiros por perto e atendeu ao desejo de Arariboia, que pediu umas terras na “Banda d’Além”.
As terras cedidas iam desde as Barreiras Vermelhas (também conhecida como Praia Vermelha, que ficava entre as praias da Boa Viagem e do Gragoatá, sendo soterrada, na década de 1970, para a construção da Via Litorânea) até a região do Maruí.
Em 22 de novembro de 1573 houve a posse solene das terras recebidas. A aldeia, chamada de São Lourenço dos Índios, foi instalada no Morro de São Lourenço, de onde se tinha ampla visão da baía e o mangue em sua base, hoje aterrado, o que dificultava uma invasão.
Com a morte de Arariboia (1587), a aldeia entrou em processo de declínio. Já a chegada da Corte de D. João VI à colônia brasileira em 1808 foi determinante para o progresso das freguesias do recôncavo e principalmente a de São João de Icaraí. O rei escolheu São Domingos ter seu sítio de lazer. A estadia na Praia Grande, em comemoração às festividades de seu aniversário, levou grande número de visitantes à localidade. O comércio e a navegação progrediram e se intensificaram.
Em 1841, foi idealizado o Plano Taulois ou Plano da Cidade Nova, que abrangia o bairro de Icaraí e parte de Santa Rosa. O arruamento foi planejado pelo engenheiro francês Pedro Taulois e executado após a elevação da cidade à condição de capital. O traçado ortogonal da malha viária se iniciava na Praia de Icaraí e terminava na Rua Santa Rosa, duplicando a área urbanizada de Niterói.
A condição de capital garantiu uma série de desenvolvimentos urbanos, dentre os quais a implantação de serviços básicos como a barca a vapor (1835) efetuado pela Cantareira e Viação Fluminense, a iluminação pública a óleo de baleia (1837) e os primeiros lampiões a gás (1847), abastecimento de água (1861), o surgimento da Companhia de Navegação de Nictheroy (1862), bonde de tração animal da Companhia de Ferro-Carril Nictheroyense (1871), Estrada de Ferro de Niterói, ligando a cidade com localidades do interior do estado (1872), bondes elétricos (1883), entre outros.
No fim do século XIX, a eclosão da revolta da armada (1893) destruiu vários prédios na zona urbana e bairros litorâneos, e paralisou as atividades produtivas da cidade, fez com que divergências políticas internas interiorizassem a cidade-sede, principal causa da transferência da capital para Petrópolis. Esta condição permaneceu por quase 10 anos, possibilitando sua entrada no século XX com o projeto de reedificação da Capital. A cidade já havia sofrido fragmentação de seu território em 1890, dada a separação das freguesias de São Gonçalo, Nossa Senhora da Conceição de Cordeiro e São Sebastião de Itaipu, que passaram a constituir o município de São Gonçalo.
O retorno de Niterói à condição de capital do Estado do Rio de Janeiro em 1903 deu-se principalmente por sua proximidade com o Rio de Janeiro, município este mais importante da rede urbana nacional (liderava as exportações de café através do seu porto), marcou um período de intervenções urbanas, promovendo a cidade de qualificada infra-estrutura, procurando organizar uma vida urbana condizente com sua condição perante o Estado Fluminense.
No final da década de 60, inicia-se a construção da Ponte Presidente Costa e Silva.
Neste mesmo período, a cidade sofreu outro impacto em sua estrutura econômica. A lei complementar n.º 20 de 1974 efetivaria a fusão dos estados da Guanabara e Rio de Janeiro, retirando de Niterói a condição de capital. A implantação do novo Estado do Rio de Janeiro ocorreu em 1975. A fusão trouxe o inevitável esvaziamento econômico da cidade, situação que se modificou com a conclusão da Ponte Rio-Niterói, pois esta intensifica a produção imobiliária nas áreas centrais e bairros litorâneos consolidados da Zona Sul (Icaraí e Santa Rosa), além de redirecionar a ocupação para áreas expansivas da cidade, como as regiões Oceânica e de Pendotiba.
(Fontes: Prefeitura de Niterói e sites na internet)
O município de Niterói tem 129,4 quilômetros quadrados, o que equivale a 0,30% da área total do Estado do Rio de Janeiro.
Tem cerca de 515 mil habitantes, segundo estimativa feita em 2020 com base no Censo de 2010 do IBGE.
Em população, é a quinta maior do Estado do Rio, que tem 92 municípios.
Apesar de ser a quinta no Estado do Rio em número de habitantes, é a segunda em empregos formais e a primeira em renda per capita.
A cidade é dividida em pelo menos 52 bairros, com subdivisões formais ou informais, segundo informação da Prefeitura.
O bairro mais populoso e com renda mais alta é Icaraí, com mais de 75 mil habitantes pelo Censo de 2010.
Em qualidade de vida, a cidade passou a ser a terceira melhor do país em 2020, com IDH de 0,886, equivalente ao da Grécia, que ocupa a 24 posição entre os 173 países acompanhados pelas Nações Unidas.
O município tem 17 praias, sendo a de Icaraí a mais famosa e um dos cartões postais da cidade. (foto da praia de Icaraí)
É um município da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, do qual está distante 15 quilômetros pela Ponte Rio-Niterói.
Foi a capital estadual entre 1834-1894 e novamente entre 1903-1975.
A cidade é um dos principais centros financeiros, comerciais e industriais do estado, sendo a 12ª entre as 100 melhores cidades brasileiras para se fazer negócios.
Segundo dados do IBGE de 2010, o produto interno bruto nominal de Niterói foi de 11,2 bilhões de reais, figurando como o quinto maior do estado, depois da capital fluminense, de Duque de Caxias, Campos dos Goytacazes e Macaé, além de ser o 45º município mais rico do Brasil.
A cidade é o segundo maior empregador formal do Estado do Rio de Janeiro, embora ocupe o quinto lugar quanto ao número de habitantes, que correspondem a 4,11% do total da população da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
Niterói está entre as cidades mais alfabetizadas do Brasil, além de apresentar a menor incidência de pobreza, a população com maior renda mensal per capita e o maior índice de longevidade municipal do Estado do Rio de Janeiro.
Segundo levantamento do Instituto Trata Brasil, com base no ano de 2014, a cidade encontra-se na 12ª posição nacional apresentando 100% do abastecimento de água tratada. Em relação ao tratamento de esgoto o município aparece na 9º colocação e está entre as 10 cidades que tratam mais de 80% do seu esgoto.