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Niterói esta semana apareceu no mapa do Instituto Nacional de Meteorologia como a cidade mais quente do Brasil: 42,2 graus. A cidade vive uma excepcionalidade meteorológica. Já choveu em São Paulo, Minas Gerais e no Rio, mas não chove aqui. Já choveu em São Gonçalo e Itaboraí e não chove em Niterói. O longo período sem chuva agrava a situação e aumenta todo tipo de riscos. Especialmente o risco de incêndios. A explicação é do secretário-adjunto de Defesa Civil de Niterói, Coronel Walace Medeiros, que conversou com o A Seguir na manhã desta terça-feira (18).
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Na entrevista, ele explicou que a combinação de calor intenso com baixa umidade é enganosa, porque diminui a sensação térmica. Quando a umidade é alta, a sensação térmica e mais intensa. Com isso, as pessoas não percebem os efeitos do calor e o risco de desidratação.
A onda extrema de calor fez com que a prefeitura adotasse medidas de emergência, como a criação dos pontos de hidratação. Os primeiros foram anunciados também nesta terça (18), mas haverá outros. O prefeito Rodrigo Neves acompanha a situação com a equipe de Defesa Civil, da secretaria do Clima, além de secretaria de Saúde, para estudar novas medidas.
O Coronel Walace afirmou que Niterói também adota um protocolo de emergência para temperaturas extremas e eventos climáticos. O Rio definiu os níveis de calor, NC4, no momento, que prevê até a possibilidade de cancelamento de eventos. Mas Niterói tem seu sistema de controle e está sendo seguido. O reforço de pessoal para os bombeiros foi uma medida. Outra foi a ação a mobilização de carros pipa para manter o abastecimento do trabalho de socorro. Outras medidas podem ser adotadas, se a chuva não chegar e o calor se prolongar.
A Seguir: Coronel, o senhor deve estar tendo uma semana atribulada, né?
Coronel Walace: Isso, uma semana atípica.
A gente tem visto o helicópteros dos bombeiros trabalhando o dia inteiro, em São Francisco, no combate ao incêndio no morro do Santo Inácio.
– Isso. A gente pediu apoio para o Corpo de Bombeiros dar atenção especial e o comandante geral, coronel Tarcísio, que é o secretário de estado de Defesa Civil, está nos apoiando em tudo o que é possível para minimizar os problemas.
Teve muita ocorrência de fogo?
– Muitas, mais de 15 que chegaram ao conhecimento da Defesa Civil. Todas elas, desde ontem, o Corpo de Bombeiros vem atuando incessantemente e nós da prefeitura, dentro das possibilidades, o que eles demandavam tentamos atende-los para, de certa forma, ajudar no serviço.
Por exemplo a Defesa Civil ajudou no acesso a pontos das comunidades porque conhecemos as comunidades, temos acesso às lideranças comunitárias, então, a gente faz muito esse papel para apoiar o Corpo de Bombeiros. A gente também tem um convênio com o Corpo de Bombeiros em que a prefeitura coloca recurso para aumentar sua capacidade operacional. Tem 15 bombeiros a mais trabalhando em Niterói, por dia, custeados pela Defesa Civil. Isso tem ajudado bastante também.
Esses fogos são espontâneos?
– A gente não tem como afirmar. Porém, por conhecimento, por trabalhar na área, esses focos não são gerados espontaneamente. São gerados por conta de alguma atitude, não vou dizer criminosa, mas uma atitude, às vezes, despretensiosa e perigosa do cidadão; cidadão que ainda tem um costume muito ruim de queimar o lixo doméstico e queimar a vegetação, os galhos próximos às suas residências.
Isso quando é feito em situações de ambiente e temperatura mais amena e com mais umidade relativa do ar, não traz problema. Mas quando a gente tem uma combinação como a desses dias que é de baixa umidade relativa do ar, somada a altas temperaturas, vira um estopim e a propagação é muito rápida. A vegetação não tem umidade suficiente para resistir e a gente tem esses problemas.
Mas no morro do Santo Inácio não tem casas…
CW: Não tem casa, mas tem pessoas que fazem trilha. Às vezes, tem focos que são originados por velas acesas em algum ponto. Tem focos que são ocasionados por resto de cigarro lançado. Tudo isso, em uma condição igual a essa, aumenta, e muito, o risco do incêndio.
O Rio entrou no Nível de calor 4. Niterói também tem um protocolo para isso?
– Niterói tem um protocolo, sim. A gente vai discutir com o prefeito Rodrigo Neves, inclusive hoje (terça-feira, 18), quais são as atitudes que a gente vai tomar a partir de amanhã. A gente também vai atuar no sentido de, diante dessa condição adversa, proteger as pessoas, os cidadãos, mas também os funcionários públicos da prefeitura. Isso é importante. A gente tá vivendo o primeiro momento de uma condição de temperatura muito elevada com umidade relativa do ar muito baixa.
A prefeitura possui uma estrutura denominada Sistema Municipal de Proteção e Defesa Civil. Nesse sistema, tem a previsão de todas as ações de resposta a emergências, nesse caso, que já existe uma previsão da ação conjunta Defesa Civil, Corpo de Bombeiros, estrutura da prefeitura apoiando os bombeiros. A partir daí, a gente está desde ontem apoiando a corporação em tudo aquilo que ela precisar e for do nosso alcance. Hoje, para que os veículos de combate a incêndio não interrompessem o trabalho saindo do local para abastecer, conseguimos mobilizar carros pipa para dar esse apoio. Essa é uma medida muito importante porque garantiu a continuidade do combate às chamas.
Ontem foram 42,2 graus com 20% de umidade, correto?
– Isso.
Uma coisa agrava a outra, né?
– Exato. Na verdade, você tem várias combinações. Se nós tivéssemos uma umidade relativa do ar alta, a gente ia ter uma sensação térmica muito mais alta. Então, a umidade relativa do ar estando baixa, contribui para a sensação térmica não estar muito alta. Então, olhando por esse prisma, é bom. Mas pelo prisma da saúde respiratória do ser humano e da questão do risco de incêndio na vegetação, é um péssimo cenário. A gente está fazendo recomendações desde ontem.
Na verdade, desde o final de semana, estamos recomendando para as pessoas beberem bastante líquido, evitar exposição ao sol, fazer alimentação leve e usar roupas leves também. Tudo isso para reduzir os efeitos porque pode virar até problema de saúde pública; aumentar o número de pessoas requerendo atendimento hospitalar. A gente se preocupa muito com isso. E, logicamente, culminando com as orientações para que não tenha queima de lixo em vegetação. Porque queimar lixo em vegetação é crime ambiental, tem que deixar isso bem claro. O cidadão tem que estar atento para esse tipo de problema.
A Defesa Civil tem um programa chamado Niterói Contra Queimadas que tem uma ação que é das mais importantes que é a ronda preventiva contra queimadas. A gente tem o mapeamento das áreas mais suscetíveis de Niterói e nossa equipe percorre essas áreas, conversando com os moradores e dando uma orientação preventiva para eles, na tentativa de evitar novos focos. Começamos a fazer isso na semana passada. Inclusive conta com a participação dos nossos voluntários.
Em Niterói, quais são as áreas mais suscetíveis a esses incêndios? Ontem, o A Seguir percorreu a cidade e encontrou as temperaturas mais altas no Largo da Batalha. Uma boa parte da cidade estava no litoral. Não sei nas medições de vocês quais são as áreas mais quentes. Esse 42,2 foram onde?
– Foi medido na estação do Barreto. A questão de pontos mais suscetíveis é onde tem a vegetação voltada para a face norte, nos morros, porque é a que recebe mais insolação, mais incidência do sol praticamente todo o dia. Quando tem essa combinação de vegetação face norte com os imóveis, residências próximas, esses são os locais de maior preocupação nossa.
No caso, seria o morro do Cavalão, de São Francisco, Vital Brazil, Fonseca?
– Exatamente. Santo Inácio também, bem como parte do PARNIT. Tem também toda parte da Zona Norte: morro do Boavista, por exemplo, e morro da Penha.
– Esses protocolos consideram a permanência do calor por um período de pelo menos três dias. A gente já tem pelo menos 15 dias de sol intenso. Os riscos estão aumentando?
– A medida em que o tempo vai passando, o calor vai permanecendo, a dinâmica da situação do vegetal é muito complicada porque ele vai ressecando. Tem lugares que você vai ver a vegetação, dá a impressão que já teve uma queima no local, mas, às vezes, não é. É simplesmente vegetal que está com estresse hídrico por conta das condições meteorológicas. Quanto mais o tempo vai passando, dentro dessa condição, mais ele vai ficando suscetível à propagação. A velocidade de propagação é mais rápida, a intensidade da chama é maior. Isso tudo contribui para o aumento da dificuldade, inclusive do combate, por parte dos bombeiros.
Niterói tem aparecido com frequência como a região mais quente. O que está acontecendo?
–Exato. Se o amigo for verificar, esse período de verão é caracterizado por chuvas. E alguns municípios, e Niterói faz parte, a gente tem tido um regime de extrema ausência de chuva. Estamos há um bom tempo sem esse tipo de registro e isso está fazendo com que essa condição fique agravada. A chuva, nesse verão, ainda não aconteceu no nível que está acontecendo em outras localidades como São Paulo; até municípios do Rio de Janeiro já registraram chuvas fortes, já, nesse verão. Minas Gerais, em alguns locais até com óbitos.
Mas Niterói está com uma condição específica de ausência de chuva. A meteorologia explica que é uma condição de bloqueio atmosférico que faz com que os núcleos de instabilidade não acessem Niterói. Teve chuva em São Gonçalo, Itaboraí, Rio Bonito, Rio de Janeiro, mas não em Niterói.
Isso é um grande desafio a ser compreendido. Até para o estudo dos meteorologistas, para a gente entender que condição é essa. Geralmente, as pessoas falam que é resultado das mudanças climáticas. É um trabalho da Defesa Civil registrar esses dados. Esses dados meteorológicos estão sendo registrados pelo Centro de Monitoramento da Defesa Civil de Niterói. Ao longo do tempo, eles vão se transformando em objeto, ferramenta para estudo para a gente entender melhor, conseguir prever melhor e criar estratégias melhores para mitigar problemas.
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