Os riscos de Niterói diante da emergência climática
Por Redação
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Atualizado 27 de maio de 2024
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Niterói já sofreu com enchentes, deslizamento de encostas e o avanço do mar,… Mas a cidade está preparada para situações extremas?
Enchentes recorrentes, como acontece em Charitas, advertem que Niterói está em área de risco. Fotos: arquivo A Seguir Niterói
A emergência no Rio Grande do Sul não atinge apenas as áreas alagadas em torno da Lagoa dos Patos, mas acende um alerta, para todo o país, sobre os riscos trazidos pelas mudanças climáticas, que tornam cidades, das mais diversas geografias, vulneráveis à chuva e à ação das marés. A pergunta é inevitável: Niterói está preparada para lidar com com os extremos climáticos?
Quais são os riscos de Niterói? Em que situações a cidade pode se ver vulnerável – uma cidade espremida entre o mar e a montanha, cortada por rios, construída sobre aterros? Como reagir numa emergência? As características da cidade que apontam para algumas situações já conhecidas: alagamentos, deslizamentos; e ressacas.
Os riscos em Niterói
Os especialistas concordam neste ponto e advertem que, ao longo do tempo, a cidade já passou por estas situações. Nas enchentes recorrentes, a pior delas em 66, no deslizamento de encostas, como aconteceu no Bumba, em 2010, e nas ressacas que levaram à construção de paredões de concreto para conter o mar, em Piratininga, Camboinhas, Itacoatiara, na região Oceânica, e até na Boa Viagem, na protegida Baía de Guanabara.
O coronel Wallace Medeiros, da Defesa Civil de Niterói, que comandou o grupo de socorro enviado a Porto Alegre, teve a sensibilidade de registrar este alerta, depois de visitar a imensa área inundada e atuar no resgate de moradores que tiveram que abandonar suas casas. “Ninguém pode estar indiferente aos extremos climáticos. Governos, gestores, empresários, moradores têm que se preparar para evitar os riscos e precisam saber o que fazer na emergência’, adverte.
Ele sabe a importância de envolver a população neste processo, a partir do trabalho de Niterói, que habilitou voluntários a atuar em caso de alertas de chuva e deslizamentos de encostas. Na equipe que levou na missão de resgate, havia oito voluntários. Inclusive surfistas especializados no manejo de jet skis.
Os riscos estão anunciados. O maior deles, e o que exige ações de prevenção está nas encostas, com obras de contenção e articulação da Defesa Civil, que criou um sistema de monitoramento, alertas e treinamento de voluntários. A região de Icaraí e Santa Rosa e também o Fonseca, as maiores concentrações urbanas da cidade, cortadas por rios, estão mais suscetíveis de alagamentos. Quando a maré está cheia, a saída da água pela Baía de Guanabara se torna mais difícil e agrava as enchentes. O avanço do mar com o aquecimento global, também ameaça a cidade. Na última ressaca, o mar levou mais um pedaço da encosta da subida da Boa Viagem, bem ao lado do muro construído no ano passado, depois de oura ressaca.
– A gente não corre o perigo de acontecer o que aconteceu em Porto Alegre, pois o rio aqui escoa para o mar. Mas, com as mudanças climáticas, os transtornos tendem a piorar. Isso tudo deve estar previsto em um plano municipal de drenagem – alertou o Coordenador do Laboratório de Drenagem e Saneamento Ambiental da UFF, professor Darío Andrade Prata Filho, em entrevista recente para o jornal O Globo.
Niterói tem atuado diante do agravamento dos eventos do clima. A cidade investiu na construção de um radar meteorológico, tem um sistema de monitoramento e equipou a Defesa Civil. Tem duas secretarias diretamente envolvidas no tema, Meio Ambiente e clima. E prepara novos investimentos para cruzar as informações sobre chuva, capacidade de drenagem do solo e marés, com o objetivo de antecipar a ocorrência de alagamentos.
Conheça os riscos apontados pelos especialistas e as ações adotadas, em Niterói, contra as emergências climáticas.
Perigo nas encostas
Em março de 2022, o prefeito Axel Grael anunciou que o município faria um investimento de R$ 398 milhões, até 2024, para a realização de obras de contenção de encostas, modernização do Centro de Monitoramento de Operações da Defesa Civil, substituição de veículos da frota municipal por carros elétricos e “projetos que visam a mitigar a emissão de gases estão entre as iniciativas do eixo Clima e Resiliência do plano Niterói 450 anos”.
Do total a ser investido, a maior “fatia” tinha como destinação obras de contenção de encostas. De acordo com a prefeitura, em 2023, foram investidos R$ 236 milhões em mais de 80 obras de contenção de encostas distribuídas por 21 bairros de Niterói.
Em fevereiro passado, foi entregue a obra realizada na encosta na Cova da Onça, no Baldeador. A prefeitura informou que o investimento foi de R$ 12,7 milhões e está inserido num pacote de R$ 94 milhões que atende as obras de contenção emergenciais espalhadas pelos bairros do Cantagalo, Caramujo, Engenhoca, Tenente Jardim, Piratininga, Badu e Jurujuba.
Na mesma época, segundo a prefeitura, outras 26 frentes de contenção de encostas estavam em andamento nos bairros do Badu, Barreto, Cantagalo, Caramujo, Santa Bárbara, Santa Rosa, Preventório, Morro do Palácio, Morro do Estado, Sapê e Viçoso Jardim.
A compra de um radar meteorológico, a instalação de sirenes em áreas de risco que são acionadas em casos de emergência provocados por chuvas extremas e a capacitação de voluntários em comunidades para atuar em auxílio à Defesa Civil da cidade são algumas das providências também já tomadas pela prefeitura.
Alagamentos
Inundações provocadas por chuvas extremas, aumento do volume das águas do mar e ressacas cada vez mais potentes e recorrentes, avançando sobre o litoral. É isso que Niterói deve enfrentar como consequência do aquecimento global, que está provocando aumento do nível dos oceanos.
Um mapeamento de risco de Niterói em função de mudanças climáticas já foi minuciosamente levantado por professores da Universidade Federal Fluminense. Está tudo em um estudo lançado ano passado e apresentado, em primeira mão, pelo A Seguir, em novembro. O estudo da UFF alerta para o aumento do nível das marés e apontou a Região Oceânica, mais especificamente, Piratininga, como a região mais vulnerável a alagamentos.
Porém, todo niteroiense sabe que basta chover um pouco mais forte que determinados trechos da cidade vão alagar. O entorno do Caio Martins, por exemplo. A região recebe a água proveniente de chuva intensa que desce do Pé Pequeno. Por baixo do complexo esportivo corre o Rio Icaraí. A prefeitura promete uma licitação para a contratação de um projeto de drenagem para a região, mas ainda sem data para a sua realização.
Avanço do mar e ressacas
Em relação às ressacas, na Região Oceânica, a prefeitura de Niterói tem recorrido a paredões nas praias contra os avanços do mar. No passado, apenas a praia de Piratininga era mais castigada, com reparos de emergência no calçadão, que se repetem periodicamente há mais de 20 anos. Agora, o paredão já ocupa um bom trecho de Camboinhas, e até Itacoatiara teve obra de emergência perto do Costão. Uma obra de engenharia mais complexa, cara e resistente à nova realidade climática.
– A ‘novidade’ em relação às ressacas é que se tornarão mais recorrentes e cada vez mais potentes. E vão aproximando o mar de lugares em que não chegavam antes. Os estudos indicam que a beira mar vai avançar e se aproximar de onde hoje é o calçadão de Piratininga, mas não vai ultrapassá-lo. Nós usamos esse conhecimento do passado, os fatos que já aconteceram, para entender o presente e projetar o que pode vir a acontecer no futuro. A natureza avisa, o tempo todo. Nós decidimos se vamos dar atenção ou não aos avisos – afirmou Fábio Ferreira Dias, do Departamento de Análise Geoambiental da UFF, um dos professores responsáveis pelo estudo “Cenário Otimista de elevação do nível médio do mar de 0,50 m e Possíveis Impactos Ambientais, Resultantes de Variações de Marés, na Cidade de Niterói”.
Para recuperar a orla de Camboinhas, que teve parte de um barranco de areia e as escadas de três quiosques derrubadas, após três ressacas seguidas, a Prefeitura optou por construir um muro de gabião. Considerada como “obra emergencial”, a recuperação de um trecho de 270 metros do total de 1.500 metros de calçadão, teve um custo de R$ 10,6 milhões , segundo informou a Prefeitura. Foi iniciada em 2022. Em abril de 2023, quando já estava concluída, um trecho do calçadão cedeu, entre dois dos muros.
Piratininga
Um canto da praia conta agora com novo paisagismo, canteiros, pergolados e gramado e cinco escadas para acesso à praia. Ganhou também mais um posto salva-vidas para uso do Corpo de Bombeiros, no mesmo modelo de dois andares como os instalados nas praias de Itacoatiara, Camboinhas e Itaipu. A prefeitura informou que a obra custou R$ 11,2 milhões.
Itacoatiara
A paisagem do Costão de Itacoatiara ganhou um novo elemento: um paredão de concreto. Trata-se de um muro de contenção cujo objetivo é resolver o deslizamento da restinga que estava acontecendo no local.
O muro foi erguido onde já existia uma das duas saídas de drenagem de água pluvial, no calçadão do bairro.
A outra fica na Prainha, na altura do Pampo Club onde pedras foram colocadas para evitar o desmoronamento da restinga e, até, de uma das paredes laterais do próprio clube. O novo muro de Itacoatiara, que ainda não está concluído, tem função similar ao erguido na areia de Camboinhas.
Boa Viagem
A Empresa Municipal de Moradia, Urbanização e Saneamento (Emusa) concluiu, em outubro passado, a obra de contenção de encosta à beira mar localizada entre a Praia das Flechas e a Avenida Engenheiro Martins Romeo, na Boa Viagem, Zona Sul de Niterói. A intervenção consistiu na estabilização do talude com uma cortina de 92 metros de extensão, o reforço do gabião já existente, e a drenagem com a colocação de duas escadas hidráulicas. O objetivo da nova contenção foi evitar os riscos de deslizamentos causados pelo impacto das ondas no solo. O investimento foi de R$ 2,7 milhões.
Na última ressaca, na semana passada, parta da encosta da subida da Boa Viagem cedeu, espalhando barro pelo mar e deixando exposta a calçada. Mais um aviso.