Por conta da edição especial do A Seguir Niterói em comemoração aos 50 anos da Ponte Rio-Niterói, a coluna de hoje não vai falar sobre cerveja. Vai relatar uma história de uma época anterior à criação da Lupulinário.
Aqui quem fala, é a jornalista Sônia Apolinário.
Sou carioca e moro em Niterói há quase 30 anos, na maior parte do tempo, trabalhando no Rio. Meus dois filhos nasceram em Niterói. Cada gravidez foi sem problemas. Nenhum único enjoo; trabalhei até a véspera dos respectivos nascimentos. O único “senão” era um sono inacreditável que eu sentia, diariamente, com hora marcada: entre 18h e 19h – horário em que, normalmente, ainda estava no trabalho.
Quando por algum milagre eu conseguia sair mais cedo, eu rumava feliz da vida para o Terminal Menezes Cortes, perto do meu trabalho à época, para pegar o “frescão” para Niterói. E torcia para que o engarrafamento da ponte estivesse monumental. Simplesmente porque tudo o que eu queria era dormir.
Mal entrava no ônibus eu apagava. Nem percebia o ônibus sair e, por milagre, acordava sempre no mesmo local: logo após a passagem pelo pedágio. Acordava revigorada.
Um dia de tempestade, eu acordei antes da hora. E juro que vi o veículo na frente mais alto do que o meu ônibus. Levei alguns segundos para entender que eu estava parada no vão central (ou por ali), que do lado de fora caíam raios e estava uma ventania incrível que chicoteava chuva na janela fechada do ônibus. E eu vi outra vez o veículo da frente “voar” e senti o meu ônibus parado balançar.
Eu sempre conversei com meus filhos na barriga (mentalmente, é claro) e tentei convencer a Luiza (minha primeira filha) que eu ainda estava dormindo e que era um pesadelo. Mas ela me fez cair na real. Entrei em pânico e comecei a tremer e ficar com falta de ar. E foi um tal de “tem uma senhora grávida passando mal, motorista”, “fica calma senhora”, “o que a senhora está sentindo ?”
Alguém tentou me informar didaticamente que era “normal” a ponte serpentear antecipando em anos o enredo da Viradouro (e eu nem sabia o significado de Arroboboi, na época). Fechei os olhos e de olhos fechados fiquei, tentando respirar. O moço que estava do meu lado trocou de lugar com uma senhora que ficou o tempo todo segurando na minha mão (não sei quem é até hoje, mas obrigada). Apareceu uma garrafinha de água, mas eu não bebi – só faltava eu também ficar com vontade de fazer xixi.
Acho que se passaram alguns séculos sem que o ônibus se movesse para frente. Só pra cima e pra baixo (pelo menos era o que me parecia). Ouvi alguém falar que a ponte fechou logo depois que o nosso ônibus entrou na via – mentalmente, agradeci muito a informação (só que não). Tudo o que eu queria era voltar a dormir e acordar após passar no pedágio, mas não rolou.
Já em Niterói, cada um que descia do ônibus perguntava gentilmente se eu estava me sentindo melhor. Eu, de olhos fechados, agradecia e dizia que sim – mas eu não estava me sentindo melhor. Eu continuava apavorada. E ainda teria que encarar as ruas alagadas até chegar em casa, mas isso já não é problema da ponte Rio-Niterói.
Lição aprendida 1: não seja muito rígido ou você pode quebrar; dance conforme a música (ou a tempestade).
Lição aprendida 2: em caso de tempestade, fique onde está – porque pior do que a ponte balançando é uma barca superlotada chacoalhando na baía onde raios adoram cair. Sim, também passei por isso, dessa vez, na companhia do Rodrigo, meu segundo filho.
Veja a cobertura completa dos 50 anos da ponte em: https://aseguirniteroi.com.br/especial-50-anos-ponte-rio-niteroi/