3 de dezembro

Niterói por niterói

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Silvia Fonseca

Silvia Fonseca é jornalista e trabalhou por 30 anos no jornal O GLOBO, onde foi Editora Executiva. Tem pós em Gestão de Redação, tem uma consultoria em soluções de mídia e é sócia fundadora do A Seguir: Niterói. Nasceu em Minas, mas mora em Niterói há 32 anos.
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Para que se desviar do estilingue? Deixe que xinguem!

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Um monumento a normas mínimas de segurança no calçadão de São Francisco

O palco da Praia de Icaraí desabou. A árvore de Natal de São Francisco virou sucata retorcida no calçadão de São Francisco. Poderosos estilingues fizeram os estragos? Não. Pelo contrário.  Os dois desmoronamentos são resultados de um fenômeno da política que só traz prejuízos para os cidadãos: a falta de oposição.

A Prefeitura diz ter gastado quase R$ 9 milhões com a decoração de Natal. E não suspendeu o contrato, nem acrescentou cláusulas de segurança, com a empresa do palco desabado em Icaraí. Pois era exatamente a mesma empresa da árvore que desmoronou menos de um mês depois em São Francisco. E daí? Deixa que a Polícia apure. A Prefeitura não deu satisfações à população, não apresentou resultados de suposta investigação sobre a queda do palco dias antes e apenas encaminhou o caso para a Polícia.

Não costuma trazer benefícios para a cidade o fato de  um prefeito  ser   eleito por  coligação de 14 partidos, além dos outros que apoiam por fora. Ainda mais sendo apadrinhado pelo então prefeito e tendo a máquina da Prefeitura nas mãos. Embora prevista na legislação eleitoral, é uma equação desequilibrada, que acaba replicada na Câmara de Vereadores, por óbvio.  Por lá não há fato que possa ser questionado a ponto de tirar o sono do prefeito e de seus incontáveis assessores. A não ser que Ministério Público, Justiça e Polícia suem muito na pressão. Mas é bom lembrar: o papel do Legislativo, além de fazer leis, é fiscalizar. E ainda:  frente ampla e majoritária no Legislativo não exime o governante de prestar contas à população.

Sem oposição, Niterói arrecada bilhões –  são mais de R$ 5 bi anuais para cerca de 500 mil habitantes –  e se dá ao direito de  investir apenas 8% do orçamento. Quem vai dizer que precisa construir creches e que muitas crianças ficaram sem vagas nas escolas? Que é urgente reduzir as filas por atendimento médico nos postos de saúde?  Quase metade da dinheirama toda que Niterói arrecada vai para pagar pessoal e encargos. Taí o escândalo da Emusa para mostrar.

E quem vai mudar, gritar, atirar de estilingue, se não há oposição?  Se não deixam que xinguem, como diria Rita Lee? A falta de críticas não faz bem a ninguém nem a poder algum, em lugar algum do mundo.

Quem conseguirá levar a cabo uma investigação sobre o desabamento do palco e o esfacelamento da árvore de Natal, que por pura sorte não provocaram grandes tragédias, se não há oposição? Pois o fato é que, noves fora a insatisfação da população, não há oposição formal, constituída, representada na Câmara, com força para investigar, apurar, acompanhar e até sugerir melhorias na aplicação dos recursos públicos.

Na Câmara, além de bolsonaristas raivosos, um ou dois lutam contra o trator oficial, como o vereador Paulo Eduardo Gomes (PSOL), que pediu apuração sobre a empresa do palco e da árvore. A mesma firma conseguira outros vários contratos de  milhares de reais com a Prefeitura, nos mais diferentes setores. Venceu o pregão para erguer a árvore de Natal por uma diferença de apenas R$ 0,33 sobre o segundo colocado, informou  o vereador.

Trinta e três centavos! Eu acredito em Papai Noel e acho que foi pura sorte.

Na falta de oposição, o Ministério Público tem tido que deixar  investigações importantíssimas de lado para “tutelar” a Prefeitura de Niterói, como informa reportagem do A Seguir: Niterói de hoje. Da lei do gabarito aos palcos desmoronados, da poluição das lagoas à falta de medicamentos nas unidades de saúde, tem ficado com o MP a tarefa de cobrar explicações da Prefeitura. Inclusive no  caso da Emusa, que serviu de cabide para abrigar parentes de representantes dos partidos governistas.

Falta transparência. O tal Portal da Transparência parece piada. Mas qual vereador sozinho consegue ter acesso a dados que a população cobra?

Não é bom para o governo (nenhum governo), e muito menos para a cidade (nenhuma cidade do mundo), a falta de oposição, de críticas, de estilingues. Porque eles servem também para ajudar na correção de rumos. Quando não há oposição, quando não se pode xingar e fiscalizar, uma hora a casa cai. E quando cai nem sempre se tem a sorte de garantir a sobrevivência de todos, como felizmente aconteceu nos casos da árvore de Natal e do palco de Icaraí.

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