Uma nova ferramenta de inteligência artificial vem desbancando o “sabe tudo” Google e a “amiga” Alexa. Trata-se do Chat GPT, lançada no final do ano passado. Como seu uso é gratuito (pelo menos até agora), muitas pessoas estão se dando ao trabalho de testar a capacidade dessa IA, cujos conhecimentos são baseados em dados disponíveis na internet até 2021.

Sendo assim, como seria uma cerveja feita pelo Chat GPT ? Lupulinário ouviu e relata as experiências que um cervejeiro caseiro, um consultor e uma cervejaria comercial tiveram com a nova inteligência artificial.

Caseiro

Leonardo Lisboa há cerca de três anos faz parte da Associação dos Cervejeiros Artesanais (AcervA) de Niterói e São Gonçalo e há cinco produz cerveja como hobby. De curiosidade, “só para ver o que acontecia”, solicitou para o Chat GPT a receita de uma “cerveja IPA para o verão brasileiro”. O estilo que a inteligência artificial sugeriu foi de uma Summer IPA:

– O que foi apresentado foi uma receita com muitos erros. Por exemplo, eu produzo entre 25 l e 30 l e avisei que queria uma receita para essa quantidade de cerveja. A receita sugerida indicava o uso de 15 Kg de grãos quando eu uso 7 Kg de grãos. Também teve erros relacionados com a fermentação, de temperatura e não teve detalhamento de rampas – contou.

Ou seja, um leigo quebraria a cara se seguisse à risca a receita da IA. Lisboa parou por ali na sua experiência. Ele não se deu ao trabalho de pedir um ajuste na receita, o que ele mesmo fez. Com as modificações, ele produziu a Summer IPA (foto) e gostou do resultado.

Na sua opinião, como fazer cerveja em casa não é algo assim tão comum, o Chat GPT não deve ter encontrado uma quantidade de informações disponíveis muito vasta. Uma situação completamente diferente quanto o assunto é programação, por exemplo.

Seria mais fácil, então, ter feito uma pesquisa no Google para obter uma receita?

– No Google eu encontraria uma receita que alguém fez. O que o Chat GPT faz é dar uma busca no que está disponível na Internet para criar uma receita original – explicou Lisboa que, por acaso, trabalha com Tecnologia da Informação no setor de Óleo e Gás.

No final das contas, ele achou a experiência válida, uma “brincadeira” que na sua opinião deu certo. Porém, faz ressalvas:

– Não recomendo para quem está começando a produzir cerveja usar essa ferramenta de IA para fazer receita. Mas para quem já conhece, não vejo problema. Não sei até onde essa ferramenta consegue ser criativa, se vai criar um ranking de experiências. Nesse momento, uma coisa é certa: a IA não substitui as trocas de informações e experiência que temos na AcervA – comentou.

 Consultor

Maurício Grille é outro integrante da AcervA Niterói São Gonçalo. Engenheiro, Tecnólogo da cerveja e consultor, ele tem se divertido arrumando “tretas” com o Chat GPT.

– A ferramenta trabalha a partir do conceito de camadas de conhecimento. Então, para ter bom resultado é preciso conhecer o assunto que vai abordar – observou ele que também é beer sommelier. 

No caso da cerveja, seu ponto de partida foi o pedido de uma receita de “Lager fácil de fazer”. Segundo ele, o resultado foi uma receita genérica, “que até daria para fazer”, mas o produto final não ficaria muito bom. Grille, então, pediu uma receita de cerveja Pilsen. Diante desse pedido mais “direcionado”, a resposta, segundo ele, foi uma “receita mais correta”.

Outras perguntas feitas por ele foram, por exemplo: qual levedura usar no Brasil e qual sugere usar. Partiu para um “papo” sobre cervejarias artesanais e questões relacionadas com guias de estilos. Fez um novo pedido: uma receita de German Pilsner tendo como base o guia BJCP.

– A receita de German Pilsner ficou bem montada, mas eu fiz perguntas para modelar essa receita. Em outra experiência, a ferramenta fez uma receita de Dubbel que ficou bem perfeita, mas eu dei todas as diretrizes. Ou seja, quando se é um especialista, a IA ajuda bastante. Eu fiz cinco perguntas e em 5 minutos a receita da Dubbel ficou pronta – contou Grille.

Na sua opinião, melhor do que fazer receitas, um uso da ferramenta com potencial para ajudar, e muito, no segmento da cerveja artesanal, é o de resolver problemas dentro da cadeia produtiva – questões que envolvam problemas relacionados com melhora de qualidade e sugestão de precificação, por exemplo.

Grille informou que a grande indústria já usa muitos recursos de inteligência artificial para monitorar sua cadeia produtiva. Porém, ainda é um recurso caro para ser aplicado em processos simples.

– No futuro, vai ser uma ótima ferramenta para facilitar a vida do cervejeiro, mas não vai, por exemplo, substituir um curso – disse Grille que não produziu nenhuma das receitas que lhe foram dadas pelo Chap GPT, pelo menos por enquanto.

Comercial

Foi o próprio Grille que contou que a mineira Prussia Bier lançou um rótulo feito com o auxílio do Chat GPT, a A.I. Black IPA (6,5% ABV, 61 IBU). Então, vamos para essa experiência.

Gerente de marketing da cervejaria, Amanda Gouveia contou que todo o projeto foi ideia do seu departamento. A começar pelo estilo da cerveja cuja receita foi pedida para a AI – a marca ainda não tinha feito uma Black IPA, um estilo que avaliam como sendo “fácil de vender”.

– A receita que a ferramenta sugeriu ia precisar passar por ajustes para se adequar à nossa fábrica. Mas esse não foi o principal ponto. Se seguíssemos a receita, a cerveja não ficaria preta, mas marrom escura, com excesso de malte torrado. Quando pedimos para reduzir isso e enfatizar um pouco os aromas lupulados, a ferramenta entregou uma American IPA tradicional. Nossa solução para a receita era usar extrato de malte. Tentamos induzir isso, mas não funcionou. Quando falamos para a ferramenta usar o extrato, a receita ficou legal – contou Amanda.

Os cervejeiros da marca, Maycon e Sildênio, não participaram da elaboração da receita. Apenas fizeram os ajustes para os equipamentos da fábrica. Amanda disse que eles não ficaram com ciúmes, mas, sim, a receita poderia ter sido feita tranquilamente “em casa”.

Na sua opinião, a experiência foi válida. Principalmente, para o marketing do rótulo. Literalmente. Isso porque, depois da receita – elaborada em 30 minutos – foi solicitado para outra inteligência artificial, o Midjourney, criar o rótulo propriamente dito e todas as peças da campanha publicitária.

– O Midjourney é uma plataforma que te retorna com imagens a partir de comandos de palavra-chave. Logo, nós entendemos as palavras-chaves que precisariam ser usadas para que retornasse uma imagem que fizesse sentido. Testamos para ver se seria capaz de fazer a criação de um lettering com um texto, por exemplo, o nome da cerveja, mas não foi capaz de fazer. Porém, gerou diversas ilustrações interessantes, todas usadas na campanha que está disponível no nosso Instagram. Tudo foi criado muito rápido. Pretendo usar a IA para outras campanhas porque é realmente prático –  explicou Amanda.

Para o ritmo de lançamentos da cervejaria, essa praticidade será uma mão na roda. A Prussia Bier fica em São Gonçalo do Rio Abaixo, cidade do Vale do Aço mineiro, tendo a fábrica capacidade para 30 mil litros por mês. E por lá, toda primeira semana do mês tem lançamento. A maior parte, não tem repeteco. Porém, o departamento de marketing já pediu “vaga” para uma nova batelada de Black IPA – os dois mil litros produzidos evaporaram, segundo Amanda. A marca, criada em 2014, tem apenas nove rótulos fixos.

Fale com o Chat GPT 

Qualquer pessoa pode testar o chatbot da OpenAI por meio de um site, gratuitamente. Confira o passo a passo:

1. Acesse o site openai.com/chat.
2. Toque em “Sign up” para criar uma conta.
3. Depois, “Create an OpenAI account”.
4. Informe um e-mail, senha e confirme a criação da conta.
5. Após a confirmação, toque em “Try it” no topo da tela.
6. Inicie a conversa com o ChatGPT.

Lupulinário

Esse texto não foi produzido pelo Chat GPT, mas por um ser humano que se transforma na Lupulinário, quando o assunto é cerveja.