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O Secretário das Culturas de Niterói, Alexandre Santini, sabe, por formação profissional, que é preciso ter o domínio da cena no palco para conquistar o público. A experiência ajuda na formulação de um ambicioso plano de investimentos do município para a cultura, que este ano reserva mais de R$ 15 milhões para promover a atividade, muito mais do que o Estado ou o governo Federal. A agenda de shows, exposições, peças de teatro, dança, festivais e eventos se espalha por toda a cidade e tem mantido cheios teatros, museus, centros culturais, praias e praças. A programação de Niterói entrou, definitivamente, na agenda cultural do estado.
– A cultura não é um luxo, ela move a vida da cidade. É um investimento com enorme retorno. Há estudos que mostram que para cada real investido na cultura a cidade recebe de volta quase o dobro, R$ 1, 80, através dos negócios que gera, da contratação dos artistas, o aluguel de espaços, equipamentos, comércio, consumo… até o pipoqueiro ganha – explica o Secretário. O projeto faz parte da estratégia do Prefeito Axel Grael para a retomada a economia, depois de dois anos de pandemia. Este ano, a previsão é que o município apoie cerca de 900 ações culturais, desde shows com artistas locais até eventos de maior porte, como a apresentação da cantora Gal Costa.
Cultura é um direito
Alexandre Santini é formado em Teoria do Teatro, com mestrado em Cultura e Territorialidades pela UFF. Foi diretor de Cidadania e Diversidade Cultural no Ministério da Cultura (2015/2016) e diretor do Teatro Popular Oscar Niemeyer (2017/2021). É autor do livro “Cultura Viva Comunitária: Políticas Culturais no Brasil e na América Latina”.
Alexandre Santini, Secretário das Culturas de Niterói. Foto: Prefeitura.
Ele assumiu a secretaria com a saída de Leonardo Giordano, que deixou o governo para se candidatar a deputado estadual. É dele a proposta de tratar a cultura como um direito, que aparece estampada em cartazes, folhetos e camisetas da equipe da secretaria. Neste sentido, o plano do governo vai além da ocupação dos espaços convencionais, como o Teatro Popular, a Sala Nélson Pereira dos Santos, o MAC, e os eventos na praia e no Campo de São Bento. A oferta de atrações se descentraliza e se espalha pelo bairros. Este ano, foram muitos os exemplos, com atividades no Fonseca, Barreto e na Região Oceânica.
– Niterói encontrou sua vocação. A cidade investe na Cultura há muito tempo E hoje tem todo um ecossistema funcionando, com financiamento próprio, para promover ações que estimulam o artesão e o artista. Porque é muito fácil ter um grande show. Mas o importante é a ocupação dos espaços da cultura. Aí você encontra a banda que toca no Horto, a Gal Costa, a exposição do Van Gogh no MAC…
O investimento de Niterói na Cultura acontece num momento em que o governo do presidente Jair Bolsonaro desmontou toda a estrutura de fomento das artes, a começar pela “demonização” da Lei Rouanet, que permitia o financiamento da Cultura. Além disso, o governo reduziu a Cultura a uma secretaria sem expressão entregue a colaboradores desqualificados, sem histórico no setor. Várias instituições sofreram ataques diretos, como o cinema nacional, a casa de Rui Barbosa, o arquivo Nacional, a Biblioteca Nacional…
(Na semana em que o A Seguir Niterói conversou com o Secretário Santini, o presidente Bolsonaro anunciava a realização de desfile de tanques, aviões e navios no Sete de Setembro, em Copacabana. Em Niterói, neste sábado (27), a Sinfonica Ambulante tocava para uma pequena multidão na Praça do Radioamador ao por do sol, em São Francisco.)
O colaborador do A Seguir Niterói, jornalista Trajano de Moraes, com seu tambor, com a Orquestra ambulante. Foto: leitor
A aposta na Cultura fez com que Niterói assumisse, este mês, a liderança do Fórum de Cultura do estado. A cidade também faz parte do programa Ibero-americano de Cultura Viva. E a carta de direitos culturais do município teve o respaldo da Unesco.
Alavanca para a economia
A Cultura, continua Santini, é também um vetor de desenvolvimento econômico, numa cidade que, como Niterói, é muito baseada no setor de serviços. ” É o soft power, quando você não se apresenta pela força, mas encontra a sua pujança na cultura, na ciência, na criatividade.” Ele cita estudos do Itaú Cultural, “que mostram o retorno do investimento no setor, para cada real investido, o retorno é de R$ 1,80.” Segundo ele, Niterói hoje atrai visitantes das cidades vizinhas como São Gonçalo, Maricá e até do Rio de Janeiro.
– O investimento da cidade chega perto de R$ 14 milhões. São R$ 9 milhões de fomento direto. Mais R$ 3 milhões em editais de renúncia fiscal, do ISS e do IPTU. São R$ 12 milhões de recursos próprios. E e outros R$ 3,8 milhões da Lei Paulo Gustavo, com repasses federais. Você tem projetos de R$ 2 mil a R$ 500 mil. Você tem que ir do pequeno ao grande. O grande show é mais visível. Mas o trabalho de base está no começo de tudo. E é importante que o empreendedor cultural local tenha acesso a estes programas, isso aparece sempre nos editais. Para que seja consistente. Tem que ser uma política de governo, para que os promotores culturais e os artistas saibam que vai se repetir no ano seguinte e terá ainda mais atrações – explicou.
No calendário da cidade, o secretário destaca a apresentação, no mês que vem, da Companhia de Dança de Débora Colker, no Teatro Popular, Cão sem plumas, inspirada num poema de João Cabral de melo Neto.
Um ecossistema funcionando
Santini destaca que o município não tem condições de promover sozinho a ocupação de todos os espaços da cidade. Mas pode, sim, criar um ambiente favorável para que a atividade cultural faça parte da vida do morador da cidade.. Este ano, o niteroiense teve chance de rever antigos espaços, como o Centro de artes da UFF e o Centro Cultural dos Correios e visitar novos endereços, como o Sesc, que promoveu um festival de Blues. A cidade, aliás, assistiu eventos de Rock, Jazz, Blues e Samba.
– O esforço de ocupação da cidade não é só da Cultura. Niterói hoje oferece muitas atrações esportivas, corridas, circuito de bicicletas, canoagem, beach tênis, trilhas… Isso tudo exige o esforço de vários setores da administração que precisam trabalhar juntos. Segurança, trânsito, conservação. Agora mesmo temos uma força tarefa trabalhando no projeto de construção do Centro Cultural do Fonseca, o primeiro da Zona Norte – explicou.
Para o secretário, uma cidade para ser atraente para o morador e para o visitante precisa ser vibrante, ter ativos culturais, teatros, museus, programação diversificada e descentralizada, esportes. E o reconhecimento do valor da cultura, como se fez agora com o tombamento do Quintal dos Pescadores de Itaipu. Na pauta, também, a Orla da Lagoa de Piratininga, que dará à cidade novas opções de lazer.
O município ainda tem muitos projetos para este ano. E prepara eventos para o Natal e o réveillon. Mas o projeto que tem merecido maior atenção da prefeitura no momento é a recuperação da igreja da Boa Viagem.
– É uma adas atrações mais bonitas da cidade. Reconhecidamente. Mas está fechada há muito tempo. Agora a igrejinha será recuperada. Tem imenso valor histórico. Mas pouca gente conhece. Tem outros prédios na ilha, que vai ter um centro de visitantes. Uma atração a mais na cidade.
A programação para os 450 anos de Niterói, no ano que vem, fica para outro momento.
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